Corrida no PSD vai das desculpas de Santana ao incómodo de Rio

A campanha para as diretas no PSD entrou este fim de semana na reta derradeira com Pedro Santana Lopes a pedir desculpas por episódios da sua breve passagem pelo cargo de primeiro-ministro e Rui Rio a reclamar, ao mesmo tempo, elevação e explicações do adversário sobre a Santa Casa e o Montepio.

Carlos Santos Neves - RTP /
“Aos que acham seriam conveniente pedir desculpas por algumas situações, peço desculpas”, lançou Pedro Santana Lopes no fim da convenção nacional da candidatura Mário Cruz - Lusa

Foi no cair do pano sobre a convenção nacional da própria candidatura, em Lisboa, 48 horas após o tenso debate emitido pela RTP, que Santana Lopes voltou ao passado. Desta feita para asseverar que soube tirar lições, embora tenha dado a entender que continua a considerar que não protagonizou quaisquer erros políticos, nas vertentes interna e externa, que forcem um pedido de desculpas. Ainda assim pediu-as. Com ironia.

“Aqueles que dizem que não tirei lições do que aconteceu em 2004 estão enganados, aos que acham que seria conveniente pedir desculpas por algumas situações, peço desculpas”, clamou, antes de percorrer capítulos do seu efémero Governo, de 2004 a 2005. A começar por uma expressão facial de Paulo Portas, seguindo-se o episódio de Teresa Caeiro.
Santana Lopes defendeu ontem a ideia de um Estado que diferencie os cidadãos em função dos rendimentos: “O Estado social não pode fornecer todos os serviços de modo tendencialmente gratuito”.
“Peço desculpa por uma careta de um ministro na cerimónia de tomada de posse, peço desculpa por uma dirigente não ter ficado numa Secretaria de Estado e ficado noutra, peço desculpa não sei bem porquê, porque ninguém teve a hombridade de me dizer”, lançou.

O antigo primeiro-ministro admitiria ainda um pedido de desculpas por ter ficado indisposto durante a tomada de posse, até mesmo pelo discurso em que invocou a imagem de um bebé numa incubadora, imediatamente antes da dissolução da Assembleia da República pela mão de Jorge Sampaio, então Presidente da República.

“Por nunca ter cometido um erro em decisões de política interna e externa, isso já não peço desculpa porque isso era o meu dever, dar o melhor por Portugal”, contrapôs.

A meia hora de discurso passou também pela ofensiva ao Governo apoiado pela esquerda parlamentar, com um desafio a António Costa para que aceite um debate uma vez decidida a nova liderança do PSD, depois do Congresso que se realiza de 16 a 18 de fevereiro na capital.

Pedro André Esteves, Ricardo Passos Mota, José Rui Rodrigues - RTP

Mas foi para os detratores no seio do próprio partido que um Santana “cada vez mais convencido” da vitória contra Rui Rio nas diretas de 13 de janeiro orientou alguns dos ataques mais acirrados.

“Não é igual escolhermos para líder do partido alguém que sabe estar presente quando o partido precisa ou que nunca está a fazer campanha com adversários políticos ou quem, em nome da dignidade pessoal, não teve rebuço nenhum em pôr-se ao lado de quem combate o partido. Não é a mesma coisa”, disparou.
“Uma posição equívoca”
Com o dedo apontado ao adversário, Pedro Santana Lopes falaria ainda de “uma posição equívoca” de Rui Rio face ao Governo socialista, rejeitando quaisquer pactos de regime no fim da atual legislatura, ainda que o país “precise muito” de tais entendimentos.

“Alguém acredita que a um ano e meio de eleições fosse agora a altura para irmos celebrar um acordo de boa-fé da parte do Governo com a oposição?”, perguntou.

Para Santana”, “agora é o tempo de construir uma alternativa” que possa mesmo arregimentar “socialistas descontentes, liberais independentes e até democratas-cristãos que não têm partido”.

Outra mensagem repetida foi a do reconhecimento pelo trabalho do líder cessante dos social-democratas, que, nas palavras de Santana Lopes, “não pôde fazer mais” enquanto primeiro-ministro, dado o contexto de intervenção da troika.

“Se Pedro Passos Coelho tivesse sido candidato, eu não estaria aqui, ao contrário do meu adversário”, rematou.
“Tintim por tintim”
Já Rui Rio esteve no sábado em Viseu, onde quis reclamar do adversário que dê explicações ao país sobre o projeto de envolvimento da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa na banca, por via de uma eventual entrada no capital do Montepio.
Em entrevista à Antena 1, o ministro do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Vieira da Silva, disse que a “ideia de que a Santa Casa podia ter um papel” na banca “é avançada pelo doutor Santana Lopes”.
“Não faço ataques pessoais, mas peço explicações tintim por tintim daquilo que aconteceu”, reivindicou, para em seguida lamentar, referindo-se a Santana Lopes, que, “em plena crise bancária, o então provedor da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa” tenha escrito “ao Governo disponibilizando-se para pôr dinheiro da Santa Casa da Misericórdia nos bancos para ajudar a limpar as imparidades”.

“É algo que vos digo com sinceridade que não posso concordar”, vincou.

Rio disse-se “muito crítico da forma como a banca foi gerida em Portugal durante anos e anos, com erros graves, os maiores dos quais no Grupo Espírito Santo”.

António Nabo, António Nunes Farias, Nelson Sousa, Carlos Valente - RTP

“E se eu sou crítico à forma como tivemos de usar dinheiro público dos nossos impostos para tapar erros cometidos na banca, menos posso aceitar que aquela parte do dinheiro público que é destinada ao combate à pobreza, a fazer misericórdia, esteja disponível para ir meter no sistema bancário”, prosseguiu o antigo autarca do Porto.

“O problema do Montepio, as imparidades do Montepio, não decorrem de qualquer ação social, decorrem na mesma de crédito concedido a quem não se deveria ter concedido crédito, a começar pelo próprio grupo Espírito Santo”, concluiu.
“Haja serenidade”
Foi também no encontro com militantes social-democratas em Viseu que Rio voltou a pedir elevação na corrida à liderança do partido. E a recordar o tom do debate da passada quinta-feira na estação pública.

“Houve uma primeira tentativa, no debate televisivo, de baixar esse nível”, afirmou, imputando uma vez mais responsabilidades ao adversário. “Pensei que as coisas tinham ficado por ali, mas hoje, quando olho para a primeira página do jornal Expresso, vejo que o nível ainda baixou mais um bocadinho”, reforçou.
“Santana Lopes, em entrevista, critica Rio, que acusa de ser limitado e paroquial”, lia-se ontem no Expresso. A candidatura de Santana veio entretanto repudiar “veementemente tais imputações, uma vez que essas palavras nunca foram proferidas pelo candidato na referida entrevista”.
“As campanhas, à medida que se aproximam do dia das eleições, tendem a apertar mais, tendem a ter um clima mais emotivo. Aquilo que eu mais desejo é que não haja esse clima mais emotivo, que haja serenidade, para que, a partir do próximo sábado, ganhe quem ganhar, o partido esteja unido e não se tenham aberto feridas que depois são muito difíceis de sarar”, exortou Rui Rio.

O candidato à sucessão de Passos alertaria depois para o perigo de “clivagens”.

“Entre os apoiantes de um lado e de outro geram-se discussões, geram-se clivagens e isso depois é que é muito difícil de recuperar. O apelo que eu faço é que isto possa ser com argumentos duros, mas com uma elevação que nunca toque o plano pessoal, que nunca se resvale para mentiras ou para meias verdades, que é isso que depois incomoda as pessoas e gera os antagonismos que nós temos de evitar, porque nós somos todos do mesmo partido”, martelou.

Mais tarde, já em declarações aos jornalistas, Rio prometeu “manter o debate no nível mais alto possível”.

“Se eu tivesse respondido ao mesmo nível, o debate baixava a nível tal que quem mais se prejudicava era o Partido Social Democrata em primeiro lugar e depois desprestigiava o próprio cargo ao qual nós nos estamos a candidatar”, propugnou.

Santana Lopes, disse o antigo autarca, “tem consciência de que vai atrás em termos de intenções de voto”, pelo que “tem de apertar o discurso”, o que até compreende. “Baixar o nível ao ponto de prejudicar o próprio partido, eu não concordo”, ressalvou.
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