Governo espera cinco dias para sindicatos de professores pedirem negociação

por RTP
A Fenprof fez chegar ao Governo cerca de 20 mil postais de apoio à luta dos professores recolhidos junto da população Rodrigo Antunes - Lusa

Terminou sem acordo a reunião convocada pelo Ministério da Educação com os sindicatos dos professores sobre a contagem de tempo de serviço. O Governo decidiu não levar hoje a Conselho de Ministros o decreto que recupera parcialmente o tempo de serviço da carreira docente e espera o prazo legal de cinco dias para os sindicatos pedirem uma reunião suplementar. A Fenprof garante que, se o governo "quer guerra", terá guerra e acusa o executivo de uma "farsa".

“As estruturas sindicais têm cinco dias úteis para pedir a negociação suplementar. Enquanto esses dias não decorrerem, o decreto-lei não ficará fechado”, garantiu a secretária de Estado Adjunta e da Educação, Alexandra Leitão. O decreto em causa prevê a recuperação de dois anos, nove meses e 18 dias de tempo de serviço e não os nove anos, quatro meses e dois dias que os sindicatos exigem.

Já esta quinta-feira, os professores montaram um protesto junto ao local onde decorre a habitual reunião de Conselho de Ministros. Uma manifestação que já estava marcada e que serviu para a Fenprof entregar cerca de 20 mil postais de apoio à luta dos professores recolhidos junto da população.

José Alberto Marques, do sindicato de professores da grande Lisboa, garantiu que irá ser analisada com os professores a hipótese de pedir ou não nova reunião com o Governo para negociar, confessando, no entanto, que “não compreendemos porque a reunião do dia anterior aconteceu”, a não ser para o governo “validar aquilo que a Assembleia da República decidiu de nova negociação”.

O responsável sindical acusou o Governo de “intransigência” e garantiu que está fora de hipótese desistir da contagem integral do tempo de serviço.

O líder da Fenprof, presente no protesto, admitiu pedir a negociação suplementar, até porque isso fará os prazos dilatar, o que implica que o Governo “não vai poder aprovar antes de 20 de dezembro a eliminação de seis anos e meio de trabalho”.

Mário Nogueira considera que a reunião de ontem foi uma tentativa de enganar o Presidente da República para lhe dizer que já negociou com professores, como exigiam normas aprovadas no Orçamento do Estado. “Não foi cumprido. Não foi negociação, foi uma farsa”, garantiu, dizendo que 2019 terá de ser de negociação.

"Não vamos fazer protestos porque há eleições, mas também não deixamos de fazer porque há eleições", argumentou Mário Nogueira.
Reunião mantém impasse
O braço de ferro que marcou os últimos meses mantém-se depois da reunião negocial desta quarta-feira se ter revelado infrutífera. O Governo tinha chamado as dez estruturas sindicais que representam os professores para este encontro, que terminou novamente sem acordo.

Ao final da noite, os ministérios da Educação e das Finanças divulgaram um comunicado conjunto a anunciar que, face ao novo impasse nas negociações, “o Governo retomará o processo legislativo do decreto-lei", porque "não pode aceitar que os professores sejam prejudicados".

"O Governo retomará o processo legislativo do decreto-lei que permite aos docentes dos ensinos básico e secundário, cuja contagem do tempo de serviço esteve congelada entre 2011 e 2017, recuperar dois anos, nove meses e 18 dias, a repercutir no escalão para o qual progridam a partir daquela data. O Governo evita, desta forma, um impasse que só prejudica os professores", lê-se no documento.

No comunicado, o Governo acusa as estruturas sindicais de “intransigência, não aceitando negociar nada que não seja a recuperação integral de nove anos, quatro meses e dois dias, recusando, assim, qualquer abertura negocial".

Um argumento que já tinha sido usado pela secretária de Estado Alexandra Leitão, à saída da reunião com os sindicatos.

Alexandra Leitão assinalou ainda que a reunião pretendia ver “se haveria alguma capacidade de aproximação, tendo em mente que o Governo fez essa aproximação que levou a chegar do zero aos dois anos e nove meses e o que se verificou foi que os sindicatos se mantêm na exigência dos nove anos e quatro meses”.

O Governo considera, no comunicado, que o “impasse só prejudica os professores”.
“Querem guerra? Guerra terão”
A FENPROF não deixou dúvidas sobre a postura perante os resultados da reunião de ontem. “Não há governo nenhum que apague seis anos e meio de trabalho aos professores. Querem guerra? Guerra terão”, ameaçou Mário Nogueira, falando de “provocação”.

“Alterou pelo menos uma vírgula? Não alterou, nem que fosse uma vírgula. Isto é uma provocação às organizações sindicais, isto é uma afronta aos professores. Dizer que na Madeira e nos Açores recuperam o tempo todo, mas no continente não é assim, é uma afronta aos professores”, acusou.

“Vamos pedir de imediato uma reunião aos grupos parlamentares, para levar a mensagem de que o Governo hoje desrespeitou também a Assembleia da República, e pedir uma nova reunião ao Presidente da República, que tem de ter consciência do que é que se passa nesta casa e vamos reunir as dez estruturas sindicais para definir o plano de lutas a desenvolver durante o ano de 2019”, adiantou.

O dirigente sindical sublinhou que os sindicatos não aceitam o que não está em negociação, que é a perda de tempo de serviço, estando apenas disponíveis para discutir o prazo e o modo.

A Governo convocou os sindicatos para esta reunião depois de o Parlamento ter decidido, no debate da especialidade do Orçamento do Estado para 2019, que o executivo tinha de voltar à mesa das negociações com os professores.

“Acabámos de sair da reunião mais absurda que se pode imaginar. A reunião de hoje foi um absurdo, uma verdadeira anedota, porque chamar-nos para dar já resposta a uma lei que não existe - e essa forma de responder é exatamente aquilo que não mereceu acordo e que até levou a Assembleia a aprovar novamente a norma - é ridículo”, declarou. O OE2019 ainda não foi promulgado pelo Presidente da República.

O sindicalista referiu que a Assembleia da República voltou a aprovar para o Orçamento do Estado de 2019 (OE2019) a norma de 2018, por considerar que o decreto de lei aprovado pelo Governo não respondia à norma e que “o Governo responde a esta norma, que é reescrita, com o mesmo decreto de lei”.

“Fomos chamados pelo Ministério da Educação, não tínhamos expectativa, mas tínhamos curiosidade, porque não sabíamos para que era a reunião, mas foi para nos dizerem que esta reunião vinha no sentido de cumprir o disposto na lei do OE2019 que, por acaso, só entra em vigor daqui a mais de um mês”, afirmou. 

“A lei do OE2019 diz que tem de haver negociação do prazo e do modo, o Governo, na sua pressa, sem saber se o Presidente da República promulga ou não o Orçamento, decidiu hoje convocar uma reunião negocial antes de a lei vigorar, para dar cumprimento à lei que ainda não existe”, criticou.
Mário Nogueira assinalou que “o segundo absurdo”, “no sentido de dar cumprimento à lei e no sentido de dizer que a negociação ia novamente ter lugar, o Governo apresentou como proposta recuperar dois anos, nove meses e 18 dias, nos exatos termos em que impôs no decreto de lei aprovado no dia 04 de outubro passado”.

A secretária de Estado adjunta e da Educação, Alexandra Leitão, contrapôs que na negociação do OE2019 na especialidade foi determinada uma norma igual à de 2018 que determinava a abertura de um novo processo negocial e que, tendo essa norma já sido aprovada e estando ainda em curso a aprovação do decreto-lei, entende o executivo que, até para não protelar mais que os professores recebam o tempo que está a ser proposto, “era o momento ideal para perceber se haveria abertura dos sindicatos”.

Questionada pela “pressa do Governo em fazer esta reunião”, Alexandra Leitão justificou que estando em curso o projeto legislativo do decreto-lei “era bem mais útil fazer esta [reunião] negocial nesse âmbito, para não atrasar a entrada em vigor do decreto-lei, tendo em conta que o mesmo irá ser benéfico para os professores”.

Os sindicatos acusam o Governo de ter “desrespeitado a Assembleia da República, com a manutenção da proposta. O Executivo considera que o Parlamento apenas impôs o regresso às negociações e não a contagem integral do tempo de serviço.
Duas votações
No comunicado enviado ontem o Governo reitera que “esta solução foi expressamente rejeitada pela Assembleia da República na votação na especialidade do Orçamento do Estado, tendo apenas sido aprovado manter aberta a via negocial, deixando os moldes dessa negociação totalmente em aberto".

O Governo diz que a recuperação do tempo de serviço nem sequer fazia parte do Programa do Governo, no qual “foi inscrito o compromisso de descongelamento das carreiras dos professores”, mas que, ainda assim, “não deixará de reconhecer, através do decreto-lei, a recuperação de tempo de serviço docente”.

Na semana passada, na votação na especialidade do Orçamento do Estado, os partidos à esquerda do PS pressionaram no sentido de ser aprovado um calendário para a recuperação integral do tempo de serviço dos professores, forças de segurança e magistrados para progressão na carreira.

As propostas sobre os professores chegaram a ser votadas duas vezes, tendo sido decidido em ambas que o Governo deveria retomar as negociações com os professores e os restantes corpos especiais da função pública, com os votos do PSD e CDS-PP e contra do PS.

O PS ficou novamente isolado e o PSD e CDS-PP só votaram as suas propostas que obrigam que o executivo volte à mesa das negociações, recusando os apelos do PCP, do BE e do PEV que aprovasse normas mais concretas, nomeadamente o faseamento, com prazos de cinco a sete anos para a contagem integral do tempo de serviço, congelado durante os anos da troika.

c/ Lusa
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