Pais Jorge demite-se da Secretaria de Estado do Tesouro

por RTP
“A minha disponibilidade para servir o país foi sempre total. Não tenho, no entanto, grande tolerância para a baixeza que foi evidenciada”, escreve Pais Jorge (à esquerda) na declaração agora divulgada Lusa

Terminou a passagem de Joaquim Pais Jorge pelo governo de Pedro Passos Coelho e Paulo Portas. Ao cabo de quase uma semana de acesa controvérsia política e mediática, em torno do papel que o até agora secretário de Estado do Tesouro terá desempenhado na apresentação de contratos swap ao anterior executivo socialista, em 2005, Pais Jorge apresentou esta quarta-feira o seu pedido de demissão à ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque. Alega bater com a porta por não ter “grande tolerância para a baixeza que foi evidenciada”.

Mediaram poucas horas entre a última tomada de posição do Ministério das Finanças sobre as ligações de Joaquim Pais Jorge ao dossier dos contratos swap, durante o seu percurso como quadro superior do Citigroup, e o anúncio da demissão do secretário de Estado do Tesouro. O governante fora chamado a integrar a equipa de Maria Luís Albuquerque há um mês e seis dias. Tomou posse a 2 de julho. Sai agora a dizer-se vítima de uma “baixeza”.

“As notícias vindas a público nos últimos dias, em que uma apresentação com mais de oito anos foi falseada para que incluísse o meu nome, revelam um nível de atuação política que considero intolerável. A minha disponibilidade para servir o país foi sempre total. Não tenho, no entanto, grande tolerância para a baixeza que foi evidenciada”, escreve o secretário de Estado demissionário numa declaração com a chancela das Finanças, a que a RTP teve acesso.

“Entendo que todos temos que dar o nosso melhor para ultrapassar as dificuldades enormes que atravessamos. No entanto, considero que não tenho que me sujeitar a este tipo de tratamento mediático de que fui alvo nos últimos dias. Foram exploradas e distorcidas declarações que fiz sempre de boa-fé. É este lado podre da política, de que os Portugueses tantas vezes se queixam, que expulsa aqueles que querem colocar o seu saber e a sua experiência ao serviço do País”, acrescenta Pais Jorge.
Dois documentos

A declaração do governante demissionário lança mão dos mesmos argumentos que haviam sido aventados ao início da madrugada pelo Ministério das Finanças. Com uma semântica em tudo semelhante.

Sem desmentir ou confirmar a presença de Pais Jorge em reuniões com o gabinete de José Sócrates em 2005 - destinadas, segundo noticiou na passada quinta-feira a revista Visão, a apresentar contratos swap para maquilhar o défice orçamental -, o Ministério de Albuquerque avançava, num comunicado que só esta manhã chegou à estação pública, com a explicação de que haveria dois documentos diferentes com a marca do Citigroup.

Um desses documentos intitula-se, de acordo com as Finanças, A Liability Management Proposal for the Republic of Portugal (Uma proposta de gestão de risco para a República de Portugal) e suportou notícias da Visão, Agência Lusa e mais recentemente da SIC sobre o envolvimento direto de Joaquim Pais Jorge na apresentação de swaps do banco norte-americano ao executivo socialista. O outro está no arquivo do IGCP – Agência de Gestão de Tesouraria e de Dívida Pública. O primeiro terá sido manipulado, na versão do governo.

A Antena1 avançou esta manhã que a revelação da existência dos dois documentos distintos levou a Procuradoria Geral da República a ordenar ao Departamento de Investigação e Ação Penal de Lisboa a abertura de um inquérito para apurar a eventual existência de ilícito criminal.
“De consciência limpa”
Na declaração de dez parágrafos, que ocupa uma só página, Joaquim Pais Jorge afirma também ter tomado “esta difícil decisão” por não permitir que “controvérsias” em redor do seu “percurso profissional” sejam “usadas como arma de arremesso político contra o Governo”.

“Saio do Governo porque temos problemas muito sérios associados à emergência económica e financeira em que fomos envolvidos e que urge resolver. Não posso permitir que o debate público se afaste dos problemas centrais e daquilo que é essencial para a vida de todos nós. Saio sem qualquer arrependimento e de consciência limpa”, enfatiza.

“Nenhuma manobra de baixa política poderia mudar a minha disposição de serviço à causa pública, nem de dedicação a Portugal. Retiro-me, no entanto, esperando muito sinceramente que a minha saída permita que todos se recentrem naquilo que é verdadeiramente importante”, remata Pais Jorge, no texto que sela a primeira baixa do governo de PSD e CDS-PP pós-remodelação.

No mesmo texto, Joaquim Pais Jorge diz ainda ter anuído ao convite de Maria Luís Albuquerque “com muito orgulho” e porque “a situação que o país atravessa é dificílima”. Escreve o governante demissionário que, embora sabendo “desde o primeiro momento” que “as dificuldades seriam imensas”, nunca pensou “que os maiores obstáculos emergissem do domínio estritamente pessoal”. Para contrapor: “Enganei-me”.
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