Robôs-armas. Académicos alertam para riscos de projeto sul-coreano

por Carlos Santos Neves - RTP
Em causa está uma parceria entre o Instituto Avançado de Ciência e Tecnologia da Coreia do Sul e o produtor de armamento Hanwha Systems Luke MacGregor - Reuters

Um conjunto alargado de académicos de três dezenas de países assinou uma carta a defender o boicote a uma universidade sul-coreana que está a colaborar com a indústria militar no desenvolvimento de armas autónomas. Em causa está uma parceria entre o Instituto Avançado de Ciência e Tecnologia da Coreia e a Hanwha Systems.

São mais de 50 os nomes de académicos que constam da carta contra o projeto sul-coreano, noticiada na edição online do jornal britânico The Guardian.A Hanwha Systems é uma das maiores fabricantes de armas da Coreia do Sul. Produz, designadamente, munições de fragmentação proibidas em 120 países.


Os investigadores signatários recusam-se a colaborar com o Instituto Avançado de Ciência e Tecnologia da Coreia (KAIST, na sigla inglesa), ou a receber nas respetivas instituições académicas quaisquer investigadores daquela universidade asiática. Invocam, para tal, receios de uma “corrida para desenvolver” armas autónomas, ou seja, dotadas de inteligência artificial.

“Há grandes coisas que podem ser feitas com a IA que salvam vidas, incluindo num contexto militar, mas declarar abertamente que o objetivo é desenvolver armas autónomas e ter um parceiro como este gera grande preocupação”, adverte o promotor da carta, Toby Walsh.

Este professor australiano da Universidade de Nova Gales do Sul sublinha que se trata, neste processo, de “uma universidade muito respeitada a formar uma parceria com um associado eticamente muito duvidoso que continua a violar normas internacionais”.

Esta iniciativa, observa o Guardian, antecede um encontro da ONU em Genebra, previsto para a próxima semana, que terá sobre a mesa precisamente o tema do armamento autónomo e dos riscos inerentes ao desenvolvimento de “robôs” programados para matar.

As inquietações de Toby Walsh foram espoletadas por um artigo do Korea Times sobre o projeto do KAIST. O académico endereçou de imediato à universidade sul-coreana um conjunto de questões sobre a parceria com a Hanwha Systems. Contudo, não obteve quaisquer esclarecimentos.
“Direitos Humanos e padrões éticos”

Por sua vez, o presidente do Instituto Avançado de Ciência e Tecnologia da Coreia, Sung-Chul Shin, citado pelo diário britânico, alega que a universidade não tem por objetivo envolver-se “no desenvolvimento de sistemas de armamento autónomo letal e robôs assassinos”.

“Enquanto instituição académica, valorizamos Direitos Humanos e padrões éticos num grau muito elevado”, sustentou o responsável em comunicado, no qual afiança também que o KAIST não levará a cabo “quaisquer atividades de investigação contrárias à dignidade humana, incluindo armas autónomas sem significativo controlo humano”.

O laboratório de investigação em armamento autónomo começou a funcionar a 20 de fevereiro. O Guardian recorda que Sung-Chul Shin anunciava então o lançamento de “um forte alicerce para o desenvolvimento de tecnologia nacional de defesa”.O texto do KAIST foi entretanto apagado.


A própria universidade sul-coreana enumerava à data, no seu site, as prioridades do projeto: “Sistemas de comando e decisão baseados em IA, algoritmos compósitos de navegação para veículos subaquáticos de larga escala sem tripulação, sistemas inteligentes de treino em aviação baseados em IA e tecnologia de busca e reconhecimento baseada em IA”.

“Desenvolver armas autónomas tornaria pior, não melhor, a situação na Península Coreana. Se estas armas fossem produzidas em todo o lado, eventualmente apareceriam na Coreia do Norte e eles não teriam quaisquer escrúpulos em usá-las contra o Sul”, avisa Toby Walsh.

Uma outra empresa sul-coreana, a Dodaam Systems, está atualmente a produzir um “robô de combate” com a capacidade de isolar alvos a uma distância de três quilómetros, já ensaiado junto à fronteira com a Coreia do Norte. Em 2015, em declarações à BBC, gestores deste fabricante garantiam que as máquinas precisariam sempre de ação humana para matar.
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