Brexit. Corbyn expõe a May o que é necessário para aprovar acordo

por Raquel Ramalho Lopes - RTP
Jeremy Corbyn defende um “estreito alinhamento com o mercado único” Peter Nicholls - Reuters

O líder da oposição no Reino Unido põe preto no branco o que precisa para votar a favor do acordo que dita os termos de saída do Reino Unido da União Europeia. A 50 dias do Brexit e pela primeira vez em meses de incerteza, a primeira-ministra tem uma hipótese credível de fazer passar o acordo que negociou com Bruxelas e evitar uma saída desregulada.

Defendendo que o cenário de saída sem acordo deve deixar de ser considerado e que “não pode haver regresso a uma fronteira física na Irlanda do Norte em nenhuma circunstância”, Jeremy Corbyn propõe cinco mudanças.

As alterações poderiam ser feitas no âmbito da Declaração Política, também a assinar com a União Europeia, para conferir maior claridade às relações futuras entre as duas partes e para definir relações económicas mais próximas com Bruxelas.

A primeira alteração seria uma “união aduaneira permanente e abrangente em todo o Reino Unido”, conforme revela o líder do Partido Trabalhista no Twitter.

Esta abrangência prevê o alinhamento do Reino Unido com as regras alfandegárias da União Europeia, tarifas externas comuns, bem como um acordo para as políticas comerciais que inclua uma palavra do Reino Unido em futuros acordos do bloco europeu.

Jeremy Corbyn defende ainda um “estreito alinhamento com o mercado único”, sustentado pela partilha de obrigações e instituições.

A consonância com a União Europeia verificar-se-ia ainda ao nível dos direitos dos trabalhadores. Corbyn propõe o “alinhamento dinâmico em direitos e proteções”, para que os padrões do Reino Unido não sejam inferiores aos do bloco europeu.

Segundo Corbyn, será necessário fazer “compromissos claros de participação nas agências da UE e programas de financiamento, incluindo áreas como o ambiente, a educação e a regulamentação industrial”.

A última mudança que o líder do Partido Trabalhista gostaria de ver incluída na Declaração Política visa acordos claros e detalhados para medidas futuras de segurança, como o acesso ao mandado de detenção europeu e a bases de dados vitais.
Resistências internas
Caso Theresa May aceitasse as propostas de Corbyn o Acordo de Saída poderia ser viabilizado em Westminster. Contudo, tanto Jeremy Corbyn como Theresa May enfrentam resistências dentro das forças políticas que lideram.
O Parlamento britânico vai voltar a debater o Acordo do Brexit e as mudanças que Theresa May quer e pode introduzir. O debate está marcado para a próxima quinta-feira, dia 14.
A imprensa internacional nota que muitos deputados trabalhistas prefeririam estar a fazer campanha para a realização de um segundo referendo, que viesse travar o processo do Brexit.

Já os conservadores poderiam manifestar oposição a um acordo alfandegário definido com o líder trabalhista. O Politico evoca mesmo o aviso que o deputado conservador Jacob Rees-Mogg fez a May, de que demasiadas cedências a Bruxelas poderiam criar um "cisma" no partido. Mais preocupada em resolver as divisões internas entre os tories, Theresa May "simplesmente não tem o capital político necessário para aceitar a proposta, mesmo que quisesse", lê-se no Politico.

As propostas de Corbyn representam uma evolução do próprio Partido Trabalhista e algumas até podem colher a aprovação de Bruxelas. O presidente da Comissão Europeia sugeriu recentemente que uma solução para o backstop passasse por uma união aduaneira permanente. Porém, a carta de Corbyn também constitui um aviso para a UE.

A receção à carta, anunciada na véspera da viagem de May a Bruxelas, foi contida. Em entrevista á Rádio 4 da BBC, o ministro David Lidington Lidington mostrou-se disponível para, juntamente com o ministro para o Brexit, Steve Barclay, debater as propostas com os trabalhistas.

No entanto, classificou de "boas intenções" a proposta de ter uma palavra em futuros acordos comerciais da UE.

Vários atores da União Europeia têm dito repetidamente que o Acordo de Saída está fechado mas, ainda ontem, o primeiro-ministro irlandês Leo Varadkar admitia margem para alterações no âmbito da Declaração Política.
May com missão difícil em Bruxelas
Esta manhã, a primeira-ministra britânica ouviu, mais uma vez, o presidente da Comissão Europeia afirmar que o bloco não está disponível para renegociar o Acordo de Saída, num encontro em que o tom foi "robusto mas construtivo".

Theresa May apresentou várias opções para resolver as preocupações expressas pelos líderes políticos sobre a solução encontrada para evitar uma fronteira com controlos aduaneiros entre a Irlanda do Norte e a República da Irlanda.
De acordo com Downing Street, está em cima da mesa: a definição de um prazo para aplicação do backstop, uma saída unilateral a decidir pelo Reino Unido ou o controlo alfandegário à distância. Porém, Bruxelas já rejeitou as duas primeiras opções e tem dúvidas quanto à viabilidade tecnológica do terceiro.
“As conversações decorreram num espírito de trabalho em conjunto para conseguir que o Reino Unido faça uma retirada ordenada da União Europeia”, declarou o porta-voz de Jean Claude-Junker, Margaritis Schinas.

Contudo, a UE está pronta para desenvolver a declaração política que definirá as relações entre as duas partes após a saída do Reino Unido.

May e Juncker decidiram que as respetivas equipas vão trabalhar para tentar encontrar uma solução para o impasse. Os negociadores principais das duas partes, Stephen Barclay do Reino Unido e Michel Barnier da UE têm encontro marcado para segunda-feira, enquanto May e Juncker voltam a reunir-se antes do final de fevereiro.
Céu, Inferno e Purgatório
A agenda da primeira-ministra britânica prevê, ainda para esta tarde, encontros com o presidente do Parlamento Europeu Antonio Tajani, com o eurodeputado belga Guy Verhofstadt e com o presidente do Conselho Europeu Donald Tusk.

Amanhã à noite, Theresa May janta em Dublin com o primeiro-ministro irlandês.

Theresa May vai encontrar-se com Donald Tusk, que ontem previu um lugar no Inferno aos políticos britânicos que defenderam mais vigorosamente a saída do Reino Unido.

Já o primeiro-ministro irlandês confessou “ser menos católico do que o amigo Donald. Ele acredita firmemente no céu e por oposição no inferno. Eu acredito no céu e nunca vi o inferno, exceto quando estava aqui em funções. É um inferno.

Também o negociador do Parlamento Europeu para o Brexit não teve pejo em acrescentar “achas à fogueira” dos brexiteers: “Bom, duvido que Lúcifer os recebesse, pois depois do que fizeram no Reino Unido ainda iam conseguir dividir o inferno.
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