Covid-19. Países europeus levantam dúvidas sobre informações vindas da China

por RTP
O contraste entre os números chineses e os europeus tem sido origem de dúvidas. Foto: Thomas Peter - Reuters

Donald Trump tem sido o líder mundial que mais culpabiliza a China pela crise pandémica originada pelo novo coronavírus. No entanto, num tom mais cuidadoso e diplomático, vários líderes europeus têm também vindo a apontar o dedo à potência asiática. França e Reino Unido são quem manifesta mais dúvidas em relação a Pequim, numa altura em que o ministro chinês dos Negócios Estrangeiros voltou a negar que o vírus tenha tido origem num laboratório de Wuhan.

“Esperamos que a China nos respeite, assim como deseja ser respeitada”, declarou na segunda-feira o ministro francês dos Negócios Estrangeiros, Jean-Yves Le Drian, depois de na semana passada o Presidente francês, Emmanuel Macron, ter dito ao Financial Times que “obviamente ocorreram coisas que não conhecemos”.

“Pequim potencia fragmentações dentro da União Europeia”, continuou Le Drian, em entrevista ao Le Monde. “A pandemia é a continuação, por outros meios, da luta entre as potências”, com especial realce para a rivalidade entre China e Estados Unidos, declarou. “Esperamos que os EUA cumpram com as suas responsabilidades e mantenham uma relação de confiança com os seus aliados”. Em resposta a acusações norte-americanas, o Ministério chinês dos Negócios Estrangeiros garantiu que o vírus não teve origem num laboratório de Wuhan.

A tensão entre França e China tinha já começado a meados de março, quando Le Drian chamou ao Ministério que tutela o embaixador chinês em Paris, Lu Shaye, depois de terem sido publicados na página oficial da embaixada vários artigos anónimos que acusavam os governos ocidentais de má gestão e comunicação durante a crise pandémica.
“Devemos colocar as perguntas mais duras”, defende Reino Unido
Também o Reino Unido tem levantado dúvidas sobre as informações transmitidas pela China. “Nada pode voltar a ser como antes” enquanto a China não clarificar totalmente todas as questões relacionadas com o vírus, defendeu na semana passada Dominic Raab, ministro britânico dos Negócios Estrangeiros.

“Creio que é absolutamente necessário levar a cabo uma revisão profunda de tudo o que aconteceu, incluindo a origem do surto”, declarou. “Devemos colocar as perguntas mais duras, sobretudo as que se referem a como surgiu toda esta crise e se a mesma não poderia ter sido travada mais cedo”. O contraste entre os números chineses e os europeus tem sido origem de dúvidas. Na China morreram 4.632 pessoas devido ao novo coronavírus, enquanto em França faleceram mais de 20 mil e no Reino Unido mais de 16 mil.

Já a Alemanha não tem confrontado a China, sua grande parceira comercial, encontrando-se dependente da potência asiática para o fornecimento de equipamentos médicos para a luta contra a pandemia. No entanto, na segunda-feira a chanceler Angela Merkel lançou um alerta.

“Quanto mais transparente for a China quanto à génese do vírus, melhor será para que o mundo aprenda com o mesmo”, defendeu.
“Batalha global dos relatos”
Até há pouco tempo, as principais figuras europeias tinham mantido uma posição discreta no que diz respeito ao papel da China na crise pandémica.

A única exceção tinha acontecido com Josep Borrell, alto representante da União Europeia para os Negócios Estrangeiros, que no fim de março alertou para a “política da generosidade” como arma de influência geopolítica na “batalha global dos relatos”, referindo-se ao facto de a China estar a ajudar outros países com o fornecimento de equipamentos médicos para o combate à Covid-19.

“A resposta de Borrell sobre a batalha dos relatos já era uma resposta bastante forte ao esforço diplomático da China para vender o modelo chinês de combate à crise de Covid-19”, considerou Mathieu Duchâtel, responsável pela Ásia no Institut Montaigne, citado pelo El Pais. “Agora começa a levantar-se a questão da transparência das informações vindas da China em relação à origem do vírus, à gestão da crise e à gravidade da situação”.
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