Covid-19. Vacina para animais pode proteger espécies em risco e humanos

por RTP
Primatas como os gorilas, que partilham 98 por cento do seu ADN com os humanos, estão especialmente suscetíveis ao novo coronavírus. John Sibley - Reuters

Cientistas e veterinários por todo o mundo estão a esforçar-se por proteger os animais do novo coronavírus através de vacinas desenvolvidas especificamente para diversas espécies. Por todo o mundo há já 30 jardins zoológicos na lista de espera para receberem doses de uma vacina que tem estado a ser administrada a gorilas. Os especialistas relembram que a prevenção é especialmente importante em espécies em vias de extinção.

Em janeiro deste ano, vários gorilas do jardim zoológico de São Diego, na Califórnia, desenvolveram uma tosse atípica. Pouco depois, testaram positivo à Covid-19. Desde então, medidas normalmente aconselhadas a humanos, como o distanciamento físico ou o controlo de eventuais sintomas, têm sido aplicadas aos animais nos zoos e reservas.

A orangotango de 28 anos Karen foi a primeira primata do mundo a ser vacinada contra o SARS-CoV-2 a 26 de janeiro deste ano, precisamente no jardim zoológico de São Diego. Karen recebeu já as duas doses da vacina produzida pela Zoetis, uma farmacêutica veterinária norte-americana, e não registou efeitos adversos.

Entretanto já outros nove primatas do mesmo zoo foram vacinados com as duas doses. Outros quatro receberam uma dose e deverão levar a segunda já em abril.

O sucesso da administração de vacinas a animais fez com que cerca de três dezenas de jardins zoológicos dos Estados Unidos e de outros países realizassem encomendas da vacina da Zoetis, que é formulada de modo a produzir uma forte resposta imunitária em determinadas espécies.

A Zoetis obteve uma licença do Departamento de Agricultura dos EUA para poder fornecer as doses num contexto experimental ao jardim zoológico de São Diego. A empresa terá agora de conseguir novas permissões para poder vender a vacina a outros espaços que alberguem animais.

Cientistas acreditam que o novo coronavírus foi originado precisamente em meio animal, entre morcegos, tendo passado depois para os humanos, possivelmente através de um outro animal intermediário. Agora, a preocupação de muitos especialistas é a inversa: que os humanos possam contagiar espécies animais.

“Neste momento, os humanos são os principais vectores do SARS-CoV-2, o que tem consequências para muitas espécies”, explicou à agência Associated Press o investigador Arinjay Banerjee.

Primatas como os gorilas, que partilham 98 por cento do seu ADN com os humanos, estão especialmente suscetíveis, assim como os felinos. Até ao momento, já houve casos confirmados de Covid-19 em gorilas, tigres e leões em zoos, e em gatos e cães domésticos.

Também as martas já foram afetadas. Os primeiros casos nesta espécie surgiram numa quinta na Dinamarca onde os trabalhadores infetaram acidentalmente os animais. Conforme se espalhou entre as martas, o vírus sofreu mutações que acabaram por ser depois encontradas em humanos contagiados. Em consequência, o Governo dinamarquês ordenou que milhões destes animais fossem abatidos. Segundo especialistas, outros animais que podem contrair o vírus são os furões, guaxinins e veados. Os porcos e o gado bovino, por outro lado, não apanham Covid-19.

“Este pode tornar-se um problema de conservação, especialmente se o vírus se começar a espalhar entre espécies selvagens com populações extremamente reduzidas, como a doninha-de-patas-pretas”, que está em risco de extinção, alertou a ecologista Kate Langwig à AP.

Ainda no mês passado, cientistas da Universidade Oxford Brookes, em Inglaterra, alertaram para o risco de transmissão da Covid-19 entre os visitantes de parques naturais no continente africano e os gorilas-das-montanhas que lá habitam e que são uma espécie ameaçada, sobrando atualmente pouco mais de mil exemplares vivos.

Apesar de, na década de 1980, vários gorilas selvagens terem sido vacinados contra o sarampo, desta vez não há planos para que sejam vacinados contra o novo coronavírus.

Para evitar o contágio de animais e as possíveis mutações que daí ocorrem, os especialistas estão a recomendar o cumprimento rigoroso de medidas como a utilização de máscaras pelos tratadores dos zoos e o distanciamento sempre que possível.

O surto em São Diego levou o jardim zoológico a instalar mais ventoinhas nas áreas onde habitam os primatas, de modo a aumentar a circulação do ar, e a tornar obrigatório o uso de duas máscaras e viseira entre os profissionais quando estes estão junto dos animais.
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