EUA. Democratas criticam Biden pelo apoio a Israel

por Mariana Ribeiro Soares - RTP
Ibraheem Abu Mustafa - Reuters

Os congressistas democratas parecem estar divididos relativamente à posição dos EUA na recente escalada do conflito entre Israel e o Hamas. Vários democratas da Câmara dos Representantes têm criticado a Casa Branca pelo apoio demonstrado a Israel nos recentes confrontos e exigem o reconhecimento e a proteção dos direitos dos palestinianos. Outros democratas defendem, entretanto, o apoio “inabalável e firme ao Estado de Israel”, relembrando que o Hamas é reconhecido pelos EUA como um grupo terrorista.

A Administração de Joe Biden expressou um profundo pesar por todas as vítimas dos recentes confrontos, que são o mais grave conflito entre israelitas e palestinianos em sete anos. No entanto, mesmo apesar das crescentes críticas do seu próprio partido, o presidente dos Estados Unidos tem demonstrado um firme apoio a Israel nas suas declarações públicas.

A minha expectativa e esperança é que isto acabe o mais cedo possível, mas Israel tem o direito de se defender, quando há milhares de rockets a voarem para o seu território”, anunciou Joe Biden, numa mensagem a partir da Casa Branca na quinta-feira.

Biden não considera que a resposta dada por parte de Israel aos ataques do Hamas (movimento islamista no poder em Gaza, considerado um grupo terrorista pelos EUA e Israel) seja desproporcionada, argumentando que os ataques deste movimento islamista a cidades israelitas “não são em legítima defesa”.

Uma das coisas que vi até agora é que não houve uma reação exagerada significativa” das forças militares israelitas, defendeu Biden, quando questionado sobre se o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, está a fazer o suficiente para impedir o aumento de violência.

Temos sido muito claros ao dizer que os ataques com rockets têm de acabar”, afirmou o secretário de Estado dos EUA, Anthony Blinken, sublinhando que foram também “muito claros sobre o direito de Israel à sua defesa”. “Cremos que os israelitas e os palestinianos merecem a mesma liberdade, segurança, dignidade e prosperidade”, sublinhou Blinken. Desde a escalada deste conflito, no início da semana, as milícias do Hamas e da Jihad Islâmica já dispararam mais de 1.600 rockets contra território israelita e Israel respondeu com ataques a cerca de mil alvos palestinianos. Há, até ao momento, registo de pelo menos 119 mortos entre os palestinianos, incluindo 31 crianças, e ainda 830 feridos. Do lado israelita, morreram pelo menos nove pessoas.

Também na quarta-feira, Joe Biden falou com o primeiro-ministro israelita a quem transmitiu o seu apoio "inabalável" à segurança de Israel.

Depois de Biden ter referido que Israel “tem o direito de se defender”, sem fazer qualquer menção aos palestinianos, os democratas têm atacado o presidente norte-americano, exigindo um maior reconhecimento dos direitos dos palestinianos.

"Declarações gerais como estas com pouco contexto ou reconhecimento do que precipitou este ciclo de violência - ou seja, as expulsões de palestinianos e os ataques a Al Aqsa - desumanizam os palestinianos e significam que os EUA vão ignorar as violações dos direitos humanos. Está errado", escreveu a congressista Alexandria Ocasio-Cortez, de Nova Iorque, no Twitter.


“Ao apenas intervir para nomear as ações do Hamas – que são condenáveis – e ao recusar-se a reconhecer os direitos dos palestinianos, Biden reforça a falsa ideia de que os palestinianos provocaram este ciclo de violência. Esta não é uma linguagem neutra. É escolhido um lado, o lado da ocupação”, criticou ainda a congressista.
Netanyahu, um “líder étnico-nacionalista”
Num discurso emotivo no plenário da Câmara dos Representantes desta sexta-feira, a única congressista palestiniana democrata, Rashida Tlaib, também teceu duras críticas à Casa Branca pelas declarações que, na sua opinião, não reconhecem a “humanidade palestiniana”.

Ao ler as declarações do presidente Biden, do secretário Blinken, do general Lloyd Austin e dos líderes de ambos os partidos, dificilmente se saberia que existem palestinianos de todo”, defendeu Tlaib.

“Não tem havido reconhecimento do ataque a famílias palestinianas que são expulsas das suas casas. Não foi feita nenhuma referência às crianças detidas ou assassinadas. Nenhuma referência à campanha sustentada de assédio e terror pela polícia israelita contra os fiéis, ajoelhados e a celebrar os dias mais sagrados num dos seus lugares mais sagrados”, apontou a congressista.


Sem conseguir conter as lágrimas ao ler uma mensagem de uma cidadã palestiniana publicada no Twitter, Rashida Tlaib apelou a condicionar a ajuda a Israel ao cumprimento dos direitos humanos internacionais e ao fim do apartheid. “Devemos, sem hesitar, exigir que nosso país reconheça que o apoio incondicional a Israel permitiu a extinção da vida palestiniana e a negação dos direitos de milhões de refugiados”, referiu a congressista.

Durante a mesma sessão na Câmara dos Representantes, a congressista Ilhan Omar condenou igualmente os ataques de Israel contra os palestinianos e apelidou Benjamin Netanyahu de “líder étnico-nacionalista”.

Recuando até 1948, ano em que foi criado o Estado de Israel, a congressista democrata somali-americana recorda que “desde então, 5,6 milhões de palestinianos foram constantemente expulsos das suas casas numa das maiores crises de refugiados da história da humanidade”.

“É um conflito onde um país, financiado e apoiado pelo Governo dos Estados Unidos, mantém uma ocupação militar ilegal por outro grupo de pessoas”, criticou ainda Omar, referindo-se aos colonatos israelitas construídos em solo palestiniano.
“Ninguém deve dar desculpas para uma organização terrorista”
Por outro lado, durante o mesmo plenário na Câmara dos Representantes, vários democratas também demonstraram o seu total apoio a Israel. A congressista Debbie Wasserman-Schulz expressou o seu apoio “inabalável e firme ao Estado de Israel”.

“O Hamas e a Jihad Islâmica são os únicos responsáveis pela escalada que levou ao derramamento de sangue de israelitas e palestinianos”, defendeu a congressista. “Nenhuma nação deve estar sujeita a uma enxurrada de rockets como esta a que temos assistido. Sem o sistema de defesa aérea Iron Dome [Cúpula de Ferro], a perda de vidas seria pior do que este pesadelo que vivemos hoje”, acrescentou, referindo-se ao sistema de defesa antiaéreo de Israel que tem conseguido intercetar a maioria dos rockets lançados a partir da Faixa de Gaza.

Josh Gottheimer, um congressista democrata de New Jersey, enfatizou que o Hamas é uma “organização terrorista” designada pelos EUA. “Ninguém aqui deve dar desculpas para uma organização terrorista. Qual é o próximo alvo da vossa simpatia? Estado Islâmico, Al-Qaeda, Hezbollah?”, questionou.

“Mesmo que nem sempre concordemos relativamente às políticas de Israel, devemos deixar muito claro que nada, nada justifica uma organização terrorista disparar rockets contra o nosso aliado”, reiterou o congressista.

No próximo domingo está agendada uma reunião do Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU), inicialmente prevista para esta sexta-feira. Os EUA opuseram-se a esta reunião, considerando que uma declaração conjunta da ONU seria "contraproducente" nesta fase.

Israel recusa-se a permitir que o Conselho de Segurança se envolva no conflito. O Conselho de Segurança reuniu-se duas vezes esta semana, mas não foi capaz de emitir uma declaração pública em resposta aos confrontos, uma vez que os EUA consideram que não seria útil.
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