Ex-quadro da FIFA admitiu subornos nos mundiais de 1998 e 2010

Chuck Blazer, antigo membro do comité executivo da FIFA, assumiu em 2013 o envolvimento num esquema de corrupção, nomeadamente no suborno de voto para a atribuição de dois campeonatos do mundo. A documentação que agora chega a público remete para um julgamento em Nova Iorque, em novembro de 2013, onde o ex-quadro é acusado de extorsão e lavagem de dinheiro e assume a compra de sufrágios na escolha dos mundiais de futebol em 1998 e 2010. A sua propensão para colaborar com as autoridades acabaria por se revelar decisiva para a investigação da justiça norte-americana ao órgão máximo do futebol.

Andreia Martins - RTP /
Arnd Wiegmann, Reuters

Quando o escândalo no topo da hierarquia da FIFA rebentou, a 27 de maio, com a acusação de 14 dirigentes e parceiros e a detenção de sete elementos em Zurique, os contornos da investigação chefiada pela justiça dos Estados Unidos eram imprecisos. O processo há mais de três anos nas mãos do FBI ganha agora novos contornos, com a divulgação dos documentos de um julgamento secreto de Chuck Blazer, decisivo para o desenrolar das investigações.

“Eu e outros membros do comité executivo da FIFA aceitámos subornos para a escolha de África do Sul como a anfitriã do Campeonato do Mundo de 2010”. As palavras são de Chuck Blazer, em novembro de 2013, perante um juiz de Nova Iorque numa audiência secreta, de forma a não comprometer a investigação em curso.
Em 2000, a África do Sul já tinha apresentado a candidatura à organização do Mundial de 2006, concurso que perdeu para a Alemanha por quatro votos.
Em causa estão as candidaturas de Marrocos e África do Sul à organização dos mundiais de futebol em 1998 e 2010, respetivamente. A votação para escolher o anfitrião do Mundial de 1998 decorreu a 2 de julho de 1992. Na altura, a França (12) conseguiu reunir mais votos que a candidatura apresentada por Marrocos (7).
Eduardo Pestana - RTP

Já a proposta da África do Sul seria bem-sucedida, na votação que decorreu a 15 de maio de 2004. A candidatura conseguiu reunir 14 votos, de forma agora comprovadamente ilícita, contra os dez votos dados a Marrocos. Perante o Tribunal de Nova Iorque, Blazer admitiu ter recebido subornos de forma continuada “por volta de 2004 e até 2011" pelo seu voto na candidatura sul-africana.

O documento de 40 páginas foi agora revelado à imprensa, na sequência de uma petição entregue por três jornalistas norte-americanos, segundo The Guardian.
Colaboração estreita
Para além das candidaturas referentes ao Campeonato do Mundo de futebol, Blazer admitiu também perante o juiz os subornos e comissões de direitos televisivos recebidas entre 1993 e o início dos anos 2000, referentes à organização da Gold Cup, principal torneio de futebol entre seleções à responsabilidade da CONCACAF.
Chuck Blazer seguiu um estilo de vida que muitos classificam como “ostentoso” até à data das acusações. Para lá dos apartamentos de luxo e as constantes viagens pelo mundo, o antigo oficial não preencheu qualquer declaração de impostos durante cinco anos entre 2005 e 2010.
Sob a acusação agravada de extorsão, fraude, lavagem de dinheiro e evasão fiscal que lhe poderia valer até 20 anos de prisão, Charles Gordon, mais conhecido por Chuck Blazer, aceitou desde logo colaborar de perto com as autoridades norte-americanas de forma a reduzir a pena. Disponibilizou testemunhos, gravações, acordos, contratos televisivos ou outras provas que viessem a ajudar a destapar a corrupção e extorsão no interior da CONCACAF, e depois na própria FIFA.

Documentação sensível cujo acesso não era problema para Blazer, antigo representante dos Estados Unidos na CONCACAF, e braço direito do trinidadiano Jack Warner durante 21 anos. O ex-presidente da confederação regional da América do Norte, Central e Caraíbas (entre 1990 e 2011) foi, por sua vez, um dos principais apoios de Sepp Blatter, enquanto vice-presidente da FIFA.
"World Cup of fraud"

Na conferência de imprensa de Loretta Lynch, poucas horas após o raide ao luxuoso hotel onde estavam reunidos os dirigentes da FIFA, foram apresentados os documentos que comprovavam a receção de dez milhões de dólares do Governo sul-africano para a realização do torneio no país. O campeonato do mundo “da fraude”, como classificou na altura a representante da justiça norte-americana. 

Os documentos comprovavam que Warner, tinha sido o destinatário do suborno relativo à atribuição do Mundial de 2010 acabaram por ter um papel decisivo na demissão de Sepp Blatter, comunicada na terça-feira, apenas quatro dias após a reeleição para o quinto mandato à frente da FIFA.

O avanço da investigação liderada pelos agentes federais norte-americanos levou a FIFA até uma crise sem precedentes ao longo dos seus 111 anos de história, instigando em última análise a demissão de Sepp Blatter à frente do órgão que comandou por mais de 17 anos.

Em paralelo com o processo conduzido pela procuradora-geral Loretta Lynch, as autoridades suíças procuram provas de extorsão de voto na escola dos anfitriões dos Campeonatos de Futebol de 2018 e 2022, na Rússia e no Qatar, respetivamente.
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