"Somos tão fortes quanto os sistemas de saúde mais fracos", avisa António Guterres

por Andreia Martins - RTP
Denis Balibouse - Reuters

O secretário-geral das Nações Unidas assina esta sexta-feira um artigo de opinião no jornal The Guardian em que apela à união dos países para fazer face ao novo coronavírus. António Guterres pede ainda uma resposta global à pandemia com a ajuda dos países mais vulneráveis e alerta que o insucesso do mundo desenvolvido no combate à Covid-19 pode representar uma nova vaga pandémica nos restantes países. A recuperação pós-coronavírus passa também por preparar o futuro e deve “levar a um mundo melhor”, exorta.

Dias depois de ter considerado a pandemia em curso como “o maior desafio global desde a II Guerra Mundial”, o secretário-geral das Nações Unidas avisa que a resposta aos desafios da Covid-19 deve ser concertada a nível internacional.

No artigo publicado esta sexta-feira no Guardian, António Guterres avisa, no entanto, que essa resposta organizada ainda não existe: “Estamos longe de ter uma resposta global coordenada e articulada que vá ao encontro da magnitude sem precedentes do que estamos a enfrentar”.

“Apenas com união o mundo poderá enfrentar a pandemia e as suas consequências”, alerta o responsável da ONU, frisando que o G20 já deu passos na direção certa, mas que estes ainda são insuficientes.
“Estamos muito longe de achatar a curva”

Guterres destaca ainda o carácter exponencial desta pandemia, prevendo que 100 mil pessoas sejam infetadas diariamente a nível global. “Estamos muito longe de achatar a curva”, avisa.

“Sem uma ação concertada e corajosa, o número de novos casos quase certamente aumentará para milhões, o que levará os sistemas de saúde a um ponto de rutura, as economias a uma queda livre e as pessoas ao desespero, com os mais pobres a serem os mais atingidos”, salienta.

O secretário-geral das Nações Unidas pede um plano de ação conjunta que se baseie em três pontos: contenção do vírus, enfrentar as consequências sociais e económicas e reconstruir um mundo melhor. “Devemos preparar-nos para o pior mas fazer tudo para o evitar”, incita.

António Guterres apela à testagem e ao rastreamento cada vez maiores, complementados por quarentenas e isolamento social, sob a liderança e orientação por parte da Organização Mundial da Saúde. “Tais medidas, apesar da descontinuidade que causam, devem ser preservadas até que surjam novas terapias e uma vacina”, destaca o secretário-geral das Nações Unidas.
Alerta, de seguida, para os perigos das consequências sociais e económicas e devastadoras.

O vírus está-se a espalhar como fogo e é provável que se mova rapidamente para sul, onde os sistemas de saúde enfrentam restrições, as pessoas são mais vulneráveis e milhões vivem em bairros densamente povoados, em campos lotados de refugiados e de pessoas deslocadas”, sublinha.

António Guterres avisa que, perante estas condições, o novo coronavírus poderá devastar o mundo em desenvolvimento e ressurgir numa segunda vaga em países onde já tinha sido suprimido: “Neste mundo interconectado, somos tão fortes quanto os sistemas de saúde mais fracos”, avisa.

O contágio do vírus transformou-se também num “contágio económico”, considera António Guterres, alertando para uma recessão “tão má ou pior que em 2009” que necessita de uma “resposta multilateral abrangente”.
“Uma economia diferente”

Para o secretário-geral da ONU, os países desenvolvidos devem ajudar países em desenvolvimento com mecanismos financeiros a nível internacional, nomeadamente através da ação do Fundo Monetário Internacional. 

António Guterres reconhece a dificuldade desse esforço, uma vez que todos, mesmo os mais ricos, estão a ter “gastos em quantidades recorde”. Avisa, no entanto, que “esses gastos serão em vão se não controlarmos o vírus” em todos os países.

O terceiro ponto definido por António Guterres passa por perspetivar o futuro. “Não podemos voltar para onde estávamos antes do Covid-19, com sociedades desnecessariamente vulneráveis a crises”, considera o secretário-geral da ONU.

“A pandemia veio lembrar, da forma mais severa possível, o preço que pagamos pelas deficiências nos sistemas de saúde, nas proteções sociais e nos serviços públicos”, assinala o responsável, considerando que a situação atual veio “exacerbar as desigualdades”.

“Está na hora de redobrar os nossos esforços para construir economias e sociedades mais inclusivas e sustentáveis, mais resilientes perante pandemias, mudanças climáticas e outros desafios globais”, ressalva, considerando que a recuperação pós-coronavírus deve levar a “uma economia diferente”.
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