Zelensky na Polónia após acordo sobre massacres de há 80 anos

por Cristina Sambado - RTP
Aleksandra Szmigiel - Reuters

O presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, está em Varsóvia para se avistar com o primeiro-ministro polaco, Donald Tusk. A deslocação acontece depois de os dois países terem chegado a acordo sobre a exumação das vítimas polacas de massacres cometidos por nacionalistas ucranianos na II Guerra Mundial.

A visita surge poucos dias depois de Tusk ter anunciado progressos na questão das exumações, dossier que tem vindo a afetar as relações entre Varsóvia e Kiev há vários anos.

“Finalmente, um avanço. Há uma decisão sobre as primeiras exumações das vítimas polacas do Exército Insurgente Ucraniano (UPA)”, escreveu Tusk nas redes sociais na sexta-feira.


“Agradeço aos ministros da Cultura da Polónia e da Ucrânia pela sua boa cooperação. Estamos à espera de novas decisões”, acrescentou.

Apesar de a Polónia ser um dos mais fortes apoiantes da Ucrânia desde a invasão russa em fevereiro de 2022, os laços entre os vizinhos têm sido tensos durante gerações devido aos assassinatos de Volhynia que ocorreram de 1943 a 1945.
Aldeias inteiras foram incendiadas e os habitantes mortos pelos nacionalistas que procuravam criar um Estado independente na Ucrânia.

Segundo os meios de comunicação polacos, as conversações de Zelensky em Varsóvia vão centrar-se na resolução de uma disputa de décadas sobre os massacres de polacos durante a II Guerra Mundial em Volhynia, atualmente no oeste da Ucrânia.

“Há muitos tópicos (para discutir), incluindo, claro, as exumações”, afirmou um funcionário do Governo polaco à agência Reuters. “O que nos interessa é a forma como estas decisões (sobre as exumações) são levadas a cabo”.

O diário polaco Rzeczpospolita informou que o início dos trabalhos de exumação estava previsto para abril.

A zona onde ocorreram os massacres, habitada por polacos e ucranianos, fazia parte da Polónia antes da II Guerra Mundial e foi ocupada pela União Soviética.

Em 2013, o Parlamento polaco reconheceu o massacre perpetrado pelo Exército Insurgente Ucraniano (UPA) durante a II Guerra Mundial como “limpeza étnica com caraterísticas de genocídio”.

A Ucrânia não aceitou esta afirmação e refere-se frequentemente aos acontecimentos de Volhynia como parte de um conflito entre a Polónia e a Ucrânia que afetou ambas as nações.
As autoridades de Kiev têm afirmado repetidamente que a Ucrânia está pronta para um “diálogo construtivo” com Varsóvia, dizendo que o passado dos países não deve pôr em perigo a sua cooperação.


A questão é difícil para a Ucrânia porque alguns dos nacionalistas ucranianos do tempo da Segunda Guerra Mundial são considerados heróis nacionais devido à luta pela criação do Estado ucraniano.

Tusk, cuja aliança governamental pró-União Europeia enfrenta eleições presidenciais em maio, está sob pressão dos nacionalistas para exumar as vítimas dos massacres.

A Polónia diz que mais de 100 mil polacos foram mortos nesses massacres por nacionalistas ucranianos. Estima-se que 15 mil ucranianos tenham sido mortos em retaliação.

A Polónia há muito que exige o livre acesso dos seus especialistas aos locais onde se crê estarem enterrados os restos mortais dos mortos, para que possam ser exumados para funerais adequados.O vice-primeiro-ministro polaco Wladyslaw Kosiniak-Kamysz afirmou, em outubro, que a Ucrânia teria de resolver a questão para poder aderir à União Europeia.

Enquanto as duas partes tentavam resolver a questão, o presidente do parlamento ucraniano proferiu em maio de 2023 palavras de reconciliação no parlamento polaco.

“A vida humana tem o mesmo valor, independentemente da nacionalidade, raça, sexo ou religião”, disse Ruslan Stefanchuk aos deputados polacos na altura.

“Com esta consciência, cooperaremos convosco, caros amigos polacos, e aceitaremos a verdade, por mais intransigente que seja”, acrescentou.

Os assassinatos assumiram um significado político adicional este ano, uma vez que o principal candidato da oposição nas eleições presidenciais polacas é o conservador Karol Nawrocki, diretor do Instituto da Memória Nacional (IPN), que tem colocado as questões históricas na linha da frente da sua campanha.A Polónia assumiu a presidência rotativa do Conselho da União Europeia este mês, com o reforço da segurança do bloco e o compromisso com a Ucrânia no topo da agenda.

O ministro ucraniano dos Negócios Estrangeiros, Andrii Sybiha, disse este mês que Kiev espera novas iniciativas para ajudar a sua luta contra a Rússia durante a presidência.

As conversações entre Tusk e Zelensky ocorrem numa altura em que o mundo se prepara para a tomada de posse do Presidente eleito dos EUA, Donald Trump, na próxima semana.

Trump prometeu resolver o conflito na Ucrânia em “24 horas” após a sua entrada em funções, o que suscita receios de que Kiev seja forçada a fazer grandes concessões em troca da paz.

c/ agências
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