Zuckerberg agarrado à liderança do Facebook promete aprender com "erros"

por Andreia Martins - RTP
"Sou o primeiro a admitir que não tivemos uma visão mais ampla de quais eram as nossas responsabilidades", disse o CEO da empresa na conferência de quarta-feira Stephen Lam - Reuters

Numa conferência telefónica com os jornalistas, o presidente executivo e co-fundador do Facebook considera que continua a ser a pessoa certa para liderar a empresa. “Quando estás a construir algo como o Facebook, que não tem precedentes no mundo, há algumas coisas que vais fazer mal”, referiu. Na próxima semana, Mark Zuckerberg vai voltar a prestar esclarecimentos, desta vez em duas audiências no Senado norte-americano.

No mesmo dia em que a empresa admitiu que o número de pessoas afetadas pela revelação indevida de informação à Cambridge Analytica chegou aos 87 milhões de utilizadores – até ao momento, a informação disponível era a de que a empresa teria acedido a dados de 50 milhões de pessoas – o principal rosto da rede social esteve quase durante uma hora a responder às questões dos jornalistas por teleconferência.

Apesar dos recentes escândalos de proteção de dados pessoais em que a empresa tem estado envolvida, Mark Zuckerberg considera que continua a ser a pessoa certa para liderar a rede social que ajudou a fundar há quase 14 anos.

Em resposta à pergunta de uma jornalista da NBC News, o CEO do Facebook respondeu “sim” quando questionado se considerava que continuava a ser “a pessoa certa” para liderar a empresa.

“Quando estás a construir algo como o Facebook, que não tem precedentes no mundo, vai haver algumas coisas em que vais errar. Se não tivéssemos errado aqui, teríamos errado em qualquer outra coisa. Acho que ninguém vai ser perfeito [neste cargo]”, completou ainda o CEO da empresa.
Facebook "deveria ter feito mais"
Zuckerberg considerou ainda que o público e utilizadores devem responsabilizar a empresa pela capacidade de “aprender com os erros”, pelas tentativas de “evoluir na nossa visão de responsabilidade” e ainda “se, no final do dia, continuamos a construir coisas que as pessoas gostam e que tornam as duas vidas melhores”.

“Sou o primeiro a admitir que não tivemos uma visão mais ampla de quais eram as nossas responsabilidades. Mas acho que é importante ter em mente que há milhões de pessoas que adoram os nossos serviços porque têm um valor real e ajudam a conectar e a construir conexões e relações todos os dias. E isso é algo de que me orgulho na nossa empresa, sei que vamos continuar a fazê-lo”, referiu.

Ainda sobre a sua continuidade no cargo, um jornalista do Financial Times perguntou a Mark Zuckerberg se a direção da empresa discutiu a eventualidade da sua saída, ao que o CEO respondeu apenas: “Não, que eu tenha conhecimento”.

Segundo o líder do Facebook, ninguém da empresa foi despedido na sequência do escândalo da Cambridge Analytica. “Eu comecei com esta empresa. Eu estou no comando. E eu sou responsável por tudo o que acontece aqui. (…) Continuo a achar que vou fazer o melhor trabalho para ajudar a empresa a seguir em frente. Não estou à procura de atraiçoar alguém para meu próprio proveito por erros que aqui cometemos”.

Sobre o movimento #deleteFacebook, em que muitos utilizadores apagaram a rede social na sequência dos mais recentes escândalos das últimas semanas, o CEO responsável pela rede social diz que não houve “um impacto significativo”, mas acrescentou rapidamente: “Mas não é nada de bom!”.

Zuckerberg admitiu na conferência telefónica de quarta-feira que a empresa “deveria ter feito mais” para proteger os utilizadores. Poucas horas antes, o diretor responsável pelo departamento de Tecnologia do Facebook, Mike Schropfer, revelou que, afinal, foram revelados os dados pessoais de quase 90 milhões de utilizadores, quando as informações anteriormente disponíveis apontavam para apenas 50 milhões.

“No total, cremos que a informação do Facebook de 87 milhões de pessoas - a maioria nos Estados Unidos - poderá ter sido partilhada indevidamente com a Cambridge Analytica”, escreveu o responsável num comunicado da empresa.

No mesmo texto, o diretor tecnológico detalhou várias mudanças que a rede social está a preparar de forma a proteger e restringir o acesso a informação por parte de outras aplicações. Já a partir de dia 9 de abril, a empresa vai disponibilizar uma ligação onde os utilizadores vão poder verificar que aplicações estão ligadas à rede social e que informações foram cedidas.

Desde o mês passado que a rede social Facebook está debaixo de uma tempestade devido à polémica com a empresa Cambridge Analytica, que é acusada de ter usado indevidamente os dados de milhões de utilizadores da rede social sem que tenha havido consentimento desde 2014.

Esses dados ajudaram a empresa a elaborar um programa informático com fins eleitorais, tendo alegadamente favorecido as campanhas de Donald Trump, nos Estados Unidos, e do Brexit, no referendo sobre a saída do Reino Unido da União Europeia, ambas em 2016.
Zuckerberg "não responde perante ninguém"
O escândalo, conhecido em março com a denúncia do whistleblower Christopher Wylie, já motivou uma queda de 16 por cento nas ações em bolsa do Facebook e motivou várias críticas ao CEO da empresa.

Scott Stringer, responsável pela gestão dos fundos públicos de pensões de Nova Iorque e um grande investidor na rede social – com cerca de mil milhões de dólares em ações na rede social – defendeu na quarta-feira, ainda antes da teleconferência, que chegou a altura de Mark Zuckerberg abandonar a empresa.

Em declarações à CNBC, Stringer destacou que o Facebook tem “dois mil milhões de utilizadores” e que a saída de Mark Zuckerberg permitiria à rede social iniciar “um segundo capítulo para recuperar a reputação”.

“Neste momento a empresa está a navegar por águas desconhecidas, e eles [a empresa] não se comportou de forma a fazer com que as pessoas se sintam confortáveis com o Facebook, ou com segurança em relação aos seus dados”, referiu o investidor.

Felix Salmon, jornalista especialista na área financeira, é da mesma opinião. Em declarações à BBC, destaca que Zuckerberg “não lidera apenas uma instituição que toca praticamente todas as pessoas do planeta. Graças a atos de engenharia financeira, ele é principal detentor de votos entre os acionistas e controla o conselho de diretores da empresa, e por isso não responde perante ninguém”.

“Segundo este modelo, ele não pode ser despedido, pode apenas renunciar ao cargo. Que é exatamente o que deveria fazer neste momento”, acrescenta ainda o especialista.

Certo para já é que Mark Zuckerberg vai enfrentar novas questões sobre a conduta do Facebook nos últimos anos, mas desta vez ao vivo, perante o escrutínio dos senadores norte-americanos, em Washington. Uma prova de fogo que virá a acontecer na próxima semana - terça e quarta-feira, 10 e 11 de abril – quando o CEO da rede social for ouvido em duas audiências no Congresso dos Estados Unidos.
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