Os ricos vão para o céu do Panamá, os outros vão para qualquer lado...

Quem pode, pode, quem não pode... paga impostos. Quem pode, pode, quem não pode... é deportado. Que mundo este, de paraísos na Terra e infernos por todo o lado.

Que mundo este, que decidiu revelar um dos maiores escândalos de sempre, exatamente, quando milhares de pessoas começavam a ser “devolvidas” ao inferno de países fustigados pela guerra, pela morte, pela destruição criadas por muitos dos “ricos” que alimentam as fortunas à custa do paradisíaco Panamá.

Do céu do Panamá não caem bombas, mas sim notas. Dinheiro puxa dinheiro, sempre se ouviu. Pobreza só leva a mais pobreza.

Como gosto de John Le Carré. “O Alfaiate do Panamá” é um tesouro. Tal como Pierce Brosnan é uma riqueza para os olhos na película que deu vida à obra de Le Carré, com Brosnan e Jamie Lee Curtis. No entanto, na história real, investigada por mais de 350 jornalistas, não há classe, “glamour” ou charme. No caso “Panamá Papers” há espionagem, sim, há um enorme trabalho de investigação que nos conduz a um mundo de arrogância, hipocrisia, “chico-espertismo” e submissão. Submissão de gente poderosa, Governos, grandes Bancos, instituições políticas, financeiras ao que existe de mais mesquinho, mais reles, mais medíocre… rasteirar os outros para viver, à grande, à custa deles.

Curioso. Na véspera, a RTP exibiu uma reportagem que fiz, aqui em Madrid, com o refugiado sírio que, com o filho ao colo, foi rasteirado por uma “jornalista” húngara na fronteira entre a Sérvia e a Hungria. Da “jornalista” não falo. É um ser que merece pena. Uma pobre de espírito. Quero referir-me a Ossamah, que recebeu um telefonema meu, na manhã de sexta-feira, e nos recebeu 20 minutos depois, o tempo que demorou a viagem entre o local onde me encontrava e Getafe, nos arredores da capital espanhola, onde trabalha e vive. Como era bom que fosse sempre assim, fácil. Sem perguntas, sem respostas programadas ou estafadas. Sem olhar para a câmara, sem discursos repetidos à frente de um espelho. Nunca tínhamos falado. A reportagem que tinha destinada para esse dia, afinal não era notícia e Ossamah foi uma opção de última hora. O caso dele foi mediatizado até à exaustão em todo o Mundo. Espanha ainda mais, porque acolheu este treinador de futebol sírio, com os filhos de 7 e de 17 anos.

Sete meses depois, continuam a tentar reunir a família. A mulher e outros dois filhos, de 13 e 18 anos, permanecem na Turquia e não há documentos, não há “papers” que abram portas. Zaid, o pequeno da família, chora todas as noites. Quer a “mami”! Espanha comprometeu-se, com a União Europeia, a acolher 17 mil refugiados. Em seis meses, recebeu 18. Três são Ossamah e os dois filhos que, longe das bombas que arrasaram a casa e separaram a família, dizem ter encontrado um paraíso na terra… e este não fica no Panamá.

Quanto aos outros “papers”, espera-se que as autoridades europeias que descobriram agora (só agora, imagine-se) que centenas, milhares de contribuintes têm andado a passar a perna a outros, sejam tão céleres a agir e a atuar como foram com a solução encontrada para milhares de refugiados. Devolve-los ao inferno e ainda pagar por isso…

pub