A Verdade do tempo ilimitado

Era uma vez a Verdade. Tinha longos braços de seda e nuvem, olhares de maravilhas e justas passadas das medidas. A Verdade tinha hábitos de aparecer a quem não a encontrasse ou mesmo a quem a desprezasse. Mas eram aqueles que a mais protegiam, que a sustentavam, que a mantinham certa e brilhante, em raio de chuva sempre transparente.

Um dia, a Verdade deixou de ser amada. Encostou-se a um silêncio branco, vazio de entendimento e deixou-se ficar, na espera de uma energia que a levasse a querer levantar-se. Mas aqueles que a protegiam tinham sido detidos pela ilusão da imortal crendice, numa fúria sodómica, ao contrário dos dizeres comuns. A Verdade ficou. E nunca mais se recuperou. Ungiu-se então de maravilhas inventadas e de ficções predestinadas a construírem mundos novos. Os mundos das artes e dos seus filhos, os artistas. Só assim, a Verdade matada poderia voltar. E ser de tempo ilimitado.

A BF16 (Bienal de Fotografia) vai abrir em Vila Franca de Xira. O novo livro de Valter Hugo Mãe (“Homens Imprudentemente Poéticos”) está nas livrarias. São ficções, invenções, diz-se assim, por aí. Mas a Verdade que existe em cada obra de arte é como que a origem de tudo, o regresso à essência, que se vela e esconde por este mundo, por já ninguém a proteger, na verdade. Nada que se esconde, nada que se camufla, a inocência que surpreende, a bondade que se ergue. Moralidades à parte, a arte projeta-se. Mesmo em cenários dos Dantes, em florestas de terror, retratos de sangue e ódios incessantes.

Porque cada leitura da arte diz, entre bens e males, e interrogações e medos e sofrimentos mantidos, para que em “finalmente respirado”, que só pode ser íntimo e encoberto, se descubra a Verdade de tantas verdades que existem em nós.

São duas propostas. Cada uma, de tempo ilimitado. Ficam assim, agarradas.

BF16 - Bienal de Fotografia 2016, Vila Franca de Xira, inaugura a 15 de outubro

 
Homens Imprudentemente Poéticos, de Valter Hugo Mãe, Porto Editora

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