Em silêncio

Cada rua que percorremos ao ler Gath Risk Halberg é uma escolha nossa, um percurso guiado e absolutamente livre. É proeza que poucos autores conseguem. Fazer de um livro não uma intimação, mas um mapa dos nossos sonhos.

Se Amália fez do nosso silêncio, momento prodigioso, falta-nos agora essa humildade para entender que só parando nesse momento preciso é que podemos dizer que o génio existe.

Ando há dias a ler um dos livros de 2015. Por obrigação profissional ou puro prazer que o trabalho me oferece, o livro ”Cidade em Chamas” de Garth Rishk Halberg é magnífico registo do único lugar onde poderia viver para além de Lisboa: Nova Iorque.

Há uns anos, estive por lá a aprender dessa secundária paixão de vida… quer dizer, primária paixão (sublinhada essa instintiva vontade) mas aos 43 anos, tenho mesmo de dizer que a primeira é o jornalismo. Como diria Woody Allen, a esquizofrenia faz-nos tão saudáveis! E daí que Nova Iorque está ligada ao cinema e aos caminhos não percorridos da minha vida.

Voltando ao livro “Cidade em Chamas” há em cada das suas mil páginas (preparem-se para essa surpresa de ler a correr, de como quem não descansa a cabeça enquanto a última página não estiver lida) uma sensação de déjà-vu… onde é que isto me aconteceu… ou porque é que conheço cada uma destas pessoas desde que sei que penso (?).

A cidade que se cruza neste livro faz das ruas, caminhos alternativos não apenas de vida mas também de pensamento, dando a esses horizontes que achamos terríveis ou felizes, respostas ambíguas. Mas sem incertezas. Ou seja, cada rua que percorremos ao ler Gath Risk Halberg é uma escolha nossa, um percurso guiado e absolutamente livre. É proeza que poucos autores conseguem. Fazer de um livro não uma intimação, mas um mapa dos nossos sonhos.

O lado mais “sexy” para a notícia é que o escritor vendeu o livro por dois milhões de dólares, ainda sem estar acabado. O lado mais importante é que o épico da cidade sempre acordada é um brilhante retrato de Nova Iorque e de cada um de nós: nas angústias e nas virtudes, nas imperfeições e nos amores.

E sim, procuro silêncios. Para me maravilhar em cada verso do tal poema, em cada frase da música ou na voz doce de Lisa Ekdahl, que um dia descobri em Nova Iorque na Virgin da Time Square, enquanto escolhia a banda sonora para a minha primeira curta-metragem.

PS: esta crónica é dedicada ao meu amigo Fernando Mateus (o Kim) que sempre acreditou em mim como cineasta. Em silêncio e muitas vezes, tenho tantas saudades tuas.

O livro “CIDADE EM CHAMAS” de Garth Risk Halberg está editado em Portugal pela Dom Quixote.

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