Instabilidade quase garantida. Quais os cenários de governabilidade?

por Joana Raposo Santos - RTP
A AD tem uma vantagem 0,89 por cento sobre o PS. Falta somar a estas contas os votos nos círculos dentro e fora da Europa. Pedro A. Pina - RTP

Menos de um por cento dos votos separam a Aliança Democrática do Partido Socialista, numa altura em que falta ainda apurar os resultados nos círculos eleitorais dentro e fora da Europa. Depois de uma noite eleitoral extremamente renhida, ainda paira no ar a incerteza. Se, por um lado, o PS já reconheceu a derrota e se assumiu como força da oposição, por outro a esquerda continua esperançosa numa solução governativa. A AD espera, por sua vez, que Luís Montenegro seja indigitado primeiro-ministro, enquanto a Iniciativa Liberal e o Chega se mostraram disponíveis para integrar uma solução.

Com 29,52 por cento dos votos (somando os resultados da AD com os da coligação PPD/PSD e CDS-PP da Madeira), a Aliança Democrática tem uma vantagem de 0,89 por cento sobre os socialistas. Falta, no entanto, somar a estas contas os votos nos círculos dentro e fora da Europa, que só serão conhecidos dia 20 de março e que irão eleger mais quatro deputados.

Até lá, permanecem as dúvidas. O líder da AD, Luís Montenegro, não detalhou ainda os cenários de governação possíveis, reiterando que cumprirá a sua palavra de não fazer entendimentos com o Chega, mas sem excluir este partido do diálogo que quer ter com todas as forças políticas para executar o seu programa.

A este propósito, disse ter "a mais firme expectativa que o PS e o Chega não constituam uma aliança negativa para impedir o governo que os portugueses quiseram" e esperar também que o presidente da República o indigite para formar o executivo.
Possibilidades à direita
Há, porém, poucas hipóteses de estabilidade com os resultados na última noite. Apesar de os dois maiores partidos continuarem com mais de dois terços dos lugares no Parlamento, a esquerda é minoritária e à direita qualquer maioria terá de se formar sempre com o contributo do Chega.

André Ventura já frisou, aliás, que o seu partido quer ser "a peça central do sistema político" e tentou colocar pressão no líder da AD, que passou a campanha eleitoral a dizer "não" a qualquer acordo. "Só um líder e um partido muito irresponsável deixarão o PS governar quando temos na nossa mão a possibilidade de fazer um governo de mudança", declarou.

Também à direita e disponível para uma solução está a Iniciativa Liberal, com Rui Rocha a frisar que o cenário resultante das legislativas é complexo e que os próximos dias serão decisivos para uma clarificação.

"Seremos responsáveis nos cenários que se venham a colocar. Não será pela Iniciativa Liberal que não haverá uma solução estável de governação. Portanto, cabe aos outros assumirem", referiu o líder dos liberais, apesar de continuar a excluir o Chega das opções.

"Estaremos cá para assumir as nossas responsabilidades, para contribuir para as soluções, para tornar Portugal um país mais próspero. Aguardemos os próximos dias", enfatizou.
Possibilidades à esquerda
Numa contabilidade dos resultados atuais, a esquerda coligada (PS, BE, CDU e Livre) consegue ter 90 eleitos, mais três do que a direita (AD e IL), se se excluir o Chega. Com a deputada única do PAN, conseguiria 91.

No entanto, o líder socialista, Pedro Nuno Santos, já assumiu a derrota e descartou uma nova geringonça. "Apesar da diferença tangencial (...), tudo indica que o resultado não permitirá ao PS ser o partido mais votado", pelo que "o Partido Socialista será oposição", declarou no seu discurso noturno.

Questionado pela comunicação social, Pedro Nuno Santos disse que "não podemos manter o país em suspenso" e que o PS não vai inviabilizar a formação de Governo da AD.
Sobre a hipótese de um acordo à esquerda, assumiu que temos de ser "realistas": "Qualquer solução dessas teria um chumbo de toda a direita".
"Na hora de uma solução apresentada pelo resto da esquerda, ela seria chumbada por toda essa direita que se uniria. Por isso é que está fora de questão. As coisas são muito simples e são claras, não as compliquemos e deixemos a tática de fora: nós não temos uma maioria, e se não temos uma maioria não a podemos apresentar como solução", insistiu o secretário-geral do PS.

Já o Bloco de Esquerda manteve a disponibilidade para um acordo, com Mariana Mortágua a sublinhar que o partido será "parte de qualquer solução que afaste a direita do governo".

"Aqui estamos e faremos exatamente aquilo que dissemos que íamos fazer: seremos parte de qualquer solução que afaste a direita do governo", declarou a coordenadora bloquista, deixando a certeza de que as forças à esquerda "sabem que contam connosco".

Também o Livre, um dos partidos que mais cresceu nestas eleições, multiplicando por quatro o número de mandatos, declarou que os resultados da última noite "mostram que há espaço para a esquerda verde europeia em Portugal" e disse esperar que ainda seja possível uma maioria que una esse espectro.

Interrogado sobre se já teve oportunidade de contactar com os restantes parceiros à esquerda, Tavares respondeu que não, mas vincou que o partido está disponível para dialogar.

"Mais do que nunca é preciso espírito de convergência, solidariedade, e união contra o autoritarismo. Estamos juntos, da parte do Livre só podem contar com convergência e cooperação perante os desafios que nos apresentam", frisou.
Possibilidade ao centro
Neste momento, a única possibilidade de dois partidos terem maioria absoluta seria uma coligação entre o PSD e o Chega ou entre o PSD e o PS, reeditando o governo do Bloco Central dos anos 1980, algo também já recusado pelos dois principais partidos portugueses.

Apesar das grandes alterações que estas eleições introduziram no panorama político português, os dois maiores partidos da democracia pós-25 de Abril continuam a ter, cada um, capacidade de bloquear qualquer proposta de alteração constitucional, com 34 por cento dos mandatos, mais de um terço dos deputados eleitos.

Essa diferença muito reduzida poderá, porém, ser alterada com o anúncio dos deputados eleitos pelo círculo da emigração da Europa e do resto do mundo.

c/ Lusa
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