Jerónimo aponta perda de legitimidade para insistir na queda do Governo

por RTP
“Consideramos que já uma redução drástica da base social de apoio deste Governo e vemos isso no concreto”, sustentou o secretário-geral comunista Tiago Petinga, Lusa

A maioria parlamentar formada por PSD e CDS-PP confere “legalidade” ao Governo, o que não significa que Pedro Passos Coelho continue a reunir condições para subsistir até ao fim da legislatura. Porque “a legitimidade”, defendeu este sábado Jerónimo de Sousa, o Executivo de coligação “já não a tem”. Em entrevista à RTP, a meio do segundo dia de trabalhos do XIX Congresso do PCP, em Almada, o secretário-geral comunista reiterou que o país carece de uma alternativa política “patriótica e de esquerda”. Sem perspetivar alianças concretas. E sem poupar um PS que “mantém a sua identificação com a política de direita”.

Jerónimo de Sousa abrira na sexta-feira os trabalhos do Congresso do PCP com um ataque cerrado ao Executivo partilhado por social-democratas e democratas-cristãos. Apelando ao “brio patriótico” dos portugueses, o secretário-geral comunista defendia então como urgente a “derrota definitiva deste Governo e a sua demissão”.

Uma “demissão”, argumentava Jerónimo na primeira intervenção de fundo do Congresso, que imporia “devolver ao povo a decisão sobre o futuro do país com a realização de eleições antecipadas”, a “saída legítima e necessária para interromper o caminho de desastre do país que está em curso”.
“Quando afirmamos esta política patriótica e de esquerda, antes da pergunta com quem, colocamos um governo para quê e para governar para quem, reforçou Jerónimo de Sousa na entrevista à editora de Política da RTP, Luísa Bastos.

“Falamos de uma política patriótica e de esquerda, naturalmente, com forças patrióticas e de esquerda”, acrescentou.

Entrevistado em direto para a edição deste sábado do Jornal da Tarde, a poucas horas de ser reconduzido como secretário-geral, Jerónimo de Sousa não quis definir calendários. Tão-pouco clarificar em que medida estaria o PCP disposto a integrar a alternativa “patriótica e de esquerda” que defende para o país. Ou seja, com ou sem um Bloco de Esquerda pós-Francisco Louçã e um PS que os comunistas continuam a identificar com “a política de direita”. Mas não retirou uma vírgula às justificações que o levaram a pronunciar-se pela queda do Governo.

“Este Governo tem de facto uma maioria. É sustentado nesta maioria que eu diria que tem legalidade, mas a legitimidade já não a tem. Porque ganhou votos, ganhou apoios, com promessas, com objetivos que levaram muita gente ao engano”, avaliou o secretário-geral do PCP.

“Não é por acaso que hoje nós consideramos que há uma redução drástica da base social de apoio deste Governo e vemos isso no concreto, na luta, na luta, com muita gente que votou PSD, que votou até no CDS”, assinalou Jerónimo, para recuperar a ideia de que está à vista “uma mudança em termos de opção”: “Essa legitimidade que o Governo invoca, hoje, está claramente prejudicada pela sua falta de promessas, por fazer uma política contrária aos interesses de muitos que votaram neles”.
“Não se trata de uma birra”

Questionado sobre prazos para a realização de eleições antecipadas, Jerónimo de Sousa tornaria a lançar mão do argumento de que “está nas mãos das instituições, mas também do povo português, fazer essa exigência e levar a essa demissão”. “O que nós consideramos é que, partindo da realidade, de uma análise da realidade, quanto mais depressa, melhor. Obviamente, este é o nosso objetivo, com os condicionalismos institucionais que existem”, continuou.

Adiante acabaria por admitir como um cenário positivo para os comunistas que a demissão do Governo pudesse ocorrer antes das eleições autárquicas de 2013: “Para Portugal e para os portugueses, era bom que acontecesse isso”.

“Não se trata aqui de uma birra, ou de estar contra um governo por estar contra. O nosso Congresso está a analisar a situação atual. Peguemos por onde pegarmos, recessão, dívida, défice, desemprego, ruína de muitas empresas e de muitos empresários, juventude sem futuro, o que é que é preciso mais para colocar esta questão central da necessidade de mudarmos de rumo”, questionou-se.
“Nós somos presos por ter cão e presos por não ter. Se falamos do Bloco, é porque falamos do Bloco. Se não falamos do Bloco, é porque não falamos do Bloco. Creio que isso não implica nem impede o diálogo”, sintetizou o secretário-geral do PCP.

Ainda relativamente a eventuais alianças, Jerónimo não fechou a porta ao “diálogo” com o Bloco de Esquerda. Mas manteve baterias assestadas aos socialistas.

“Em relação ao PS, a questão de fundo é esta: o PS afirma-se de esquerda, mas depois, em relação a grandes questões estruturantes, mantém a sua identificação com a política de direita. Isto não é uma crítica vã”, vincou o dirigente partidário, para acrescentar que também em matéria de resgate financeiro os socialistas incorrem em contradições, quando criticam “o memorando da troika” a que estão vinculados.

“Estamos a falar de um instrumento político que não é um instrumento genérico. Esse pacto de agressão, esse memorando, aponta objetivos, metas, despedimentos, ataca as relações laborais, destruição das funções sociais do Estado”, desfiou.

Quanto à sua sucessão no cargo de secretário-geral, dentro de quatro anos, Jerónimo de Sousa foi hermético: “Eu tenho aceitado e aceito as responsabilidades que o partido me entende atribuir porque considero que isso é a melhor forma de corresponder a essa responsabilização. Até aqui tenho a confiança dos meus camaradas e não serei eterno, naturalmente. Isto um dia terminará”.
pub