Israel. Intenção de anexar Vale do Jordão gera onda de críticas

por RTP
O primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, a 10 de setembro de 2019 Reuters

O primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, prometeu esta terça-feira anexar o Vale do Jordão e áreas a norte do Mar Morto, caso seja reeleito na próxima semana, nas eleições legislativas marcadas para 17 de setembro.

Liga Árabe, Jordânia, Turquia e o Governo palestiniano, reagiram entre apelos à prudência e a indignação.

"É uma violação flagrante do direito internacional, é um flagrante roubo de terras, é limpeza étnica", barafustou à Agencia France Presse, Hanane Achraoui, alto quadro da Organização de Libertação da Palestina, OLP.

"Ele destrói não apenas a solução a dois Estados, mas toda a possibilidade de paz, isto muda-lhe o sentido", acrescentou Achraoui.

Saeb Erekat, o líder palestiniano para as negociações de paz, considerou o plano anunciado por Netanyahu um crime de guerra à luz do direito internacional sobre o território ocupado.
Israel capturou a Cisjordânia na guerra em 1967 e mantém-na através da força e de colonatos, enquanto os palestinianos reivindicam a área como parte territorial do seu futuro Estado.

Os ministros da Liga Árabe condenaram igualmente os planos de Netanyahu, sublinhando que iriam prejudicar qualquer possibilidade de progresso com fim a uma paz israelo-palestiniana.

Vivem no Vale do Jordão e no norte do Mar Morto, cerca de 65 mil palestinianos e 11 mil colonos israelitas, de acordo com um grupo israelita defensor dos Direitos Humanos, B'Tselem. A principal cidade palestiniana é Jericó, com cerca de 28 aldeias e comunidades menores de beduínos.

O Vale do Jordão estende-se por 2,400 quilómetros quadrados, do Mar Morto a sul até a cidade israelita de Beit Shean, a norte, e conta quase 30 por cento para a Cisjordânia.

Israel sempre disse que pretende manter ali o controlo militar sob qualquer acordo de paz com os palestinianos. Estes querem que seja o perímetro leste do seu futuro Estado, a estabelecer na Cisjordânia e na Faixa de Gaza.
Violência em toda a região

Em comunicado, o ministério dos Negócios Estrangeiros da Jordânia alertou por seu lado para consequências extremamente graves de tal iniciativa por parte de Israel.

"A Jordânia denuncia a intenção de Netanyahu de aplicar a soberania de israel sobre o Vale do Jordão e a parte norte do Mar Morto", pois isso "conduziria toda a região para a violência", lê-se no texto emitido pelo ministério do chefe da diplomacia jordana, Aymane Safadi.

No Cairo, onde se encontra para reuniões da Liga Árabe, Safadi criticou as "promessas eleitoralistas de Netanyahu e as medidas unilaterais que prevê, que arriscam matar todo o processo de paz e constituem uma ameaça à paz e segurança na região".

A Jordânia, a par do Egito, é o único país árabe a ter assinado um tratado de paz com Israel, em 1994. É igualmente a guardiã dos lugares santos muçulmanos de Jerusalém, localizados no leste da cidade, o setor palestiniano da cidade anexada por Israel em 1967.

Já a Turquia denunciou uma promessa eleitoral "racista" do primeiro-ministro de Israel.

"A promessa racista de Netanyahu, que profere todo o tipo de mensagens agressivas e ilegais antes das eleições, é a de um estado racista e de apartheid", escreveu na rede Twitter o ministro turco dos Negócios Estrangeiros, Mevlut Cavusoglu.
A sobrevivência de Netanyahu
A promessa de Netanyahu, considerada eleitoralista por surgir a uma semana do escrutínio de dia 17, visa sobretudo retirar apoios ao partido israelita de direita Azul e Branco, do ex-comandante das Forças Armadas, Benny Gantz.

Este defende políticas de domínio da Cisjordânia ainda mais radicais do que o Likud, liderado pelo primeiro-ministro. Ambos os partidos estão num empate técnico, de acordo com as mais recentes sondagens.

"É uma manobra eleitoral e nem sequer impressiona, de tão transparente que é", reagiu esta terça-feita Yair Lapid, co-líder do partido Azul e Branco, em comunicado sobre os planos de Netanyahu.

Estas são as segundas eleições em Israel menos de seis meses, depois de Benjamin Netanyahu, no poder na última década e vencedor em abril sem maioria, ter fracassado na tentativa de formar Governo.

Como primeiro-ministro em luta pela reeleição e pela sobrevivência política, acossado por escândalos e processos em tribunal, Benjamin Netanyahu procura agora marcar a agenda mediática, a uma semana das eleições.

Além do anúncio de expansão, esta terça-feira, também segunda-feira o primeiro-ministro centrou as atenções, ao acusar publicamente o Irão de ter uma base secreta onde desenvolveu armas nucleares.

As acusações, baseadas em fotografias aéreas e em documentos iranianos furtados pelos serviços de informação israelitas em 2018, foram apesar de tudo vagas.

Vários analistas referem que o local já poderia ter sido desativado em 2015, ano em que Teerão assinou com as principais potências mundiais, um Acordo para por fim ao seu programa nuclear em troca de levantamento de sanções.
Casa Branca reticente
Um dos objetivos de Netanyahu, além de se mostrar como o defensor de Israel, seria o de boicotar a aproximação, sob a égide de França, do Presidente norte-americano, Donal Trump, a Teerão.

Também esta terça-feira, ao mencionar a sua intenção de estender a soberania israelita, Netanyahu condicionou-a não só à sua vitória nas eleições, mas também ao plano de paz de Trump para a região, que deverá ser publicado até final de setembro.

A Casa Branca tirou contudo o tapete ao primeiro-ministro israelita.

"Não há qualquer alteração neste momento na política dos Estados Unidos", garantiu um alto responsável da Administração norte-americana, questionado sobre se a Casa Branca iria apoiar esta iniciativa israelita.

"Iremos publicar a nosa Visão para a Paz, após a eleição israelita e trabalhar para conseguir o melhor caminho em frente para trazaer à região a segurança, a estabilidade e as oportunidades há muito procuradas", acrescentou.

Em maio, o conselheiro presidencial e genro de Trump, Jared Kuschner, autor do plano de paz para a região, disse esperar que Israel tivesse um olhar atento às propostas do Presidente antes de "encetar qualquer plano" de anexação da Cisjordânia.

Em junho, numa entrevista ao New York Times, o embaixador dos EUA para Israel, David Friedman, disse que, "sob certas circunstâncias" Israel tinha "direito a ficar com parte, mas provavelmente não toda, a Cisjordânia."
pub