Tubarões e raias à beira da extinção. Um péssimo sinal também para os humanos

por RTP
Manta gigante Andrea Marshall, bióloga MMF

Um novo estudo à escala global revela um declínio superior a 70 por cento nas populações oceânicas de tubarões e de raias nos últimos 50 anos e aponta o dedo ao excesso de pesca. A investigação indica que o fenómeno se está a dar à escala planetária.

De acordo com as análises, desde 1970 os números destes predadores de topo diminuíram 71 por cento. O risco de extinção global ameaça atualmente três quartos das espécies.

O estudo, publicado no final de janeiro na revista Nature, abrangeu 31 espécies oceânicas de tubarões e de raias.
A investigação cruzou décadas de dados recolhidos no mundo inteiro, num esforço liderado pelo Projeto Global Shark Trends, que une o Grupo Especialista em Tubarões da União Internacional para a Conservação da Natureza, da Universidade Simon Fraser, da Universidade James Cook e do Aquarium de Georgia, com apoio do Fundo de Conservação de Tubarões.
A tendência de decréscimo no número de animais tem vindo a acentuar-se sobretudo desde os anos 80 do século passado mas agravou-se exponencialmente nos últimos anos.

De acordo com a Lista Vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza, IUCN, em 2014 um quarto das populações destas espécies estava ameaçado de extinção.

Em apenas sete anos, o número saltou para três quartos das populações, 75 por cento.

Ainda mais alarmante, metade destas espécies, 16 das 31, está já considerada em risco grave de desaparecimento.

Para os investigadores, o fenómeno explica-se pela pressão exercida sobre os recursos piscatórios, calculada atualmente em 18 vezes acima do índice de Pressão Relativa de Pesca (que analisa o nível de exploração relativamente ao número existente de peixes).

Isto significa que as reservas de peixe estão em declínio no mundo inteiro e que a garantia de alimento está a desaparecer para muitas populações – incluindo as humanas. O desaparecimento destas espécies pelágicas ameaça ainda a saúde dos ecossistemas oceânicos como um todo, ressalvam.

Os investigadores concluem pela necessidade de medidas urgentes para evitar o colapso das populações, evitar a perturbação das funções ecológicas e promover a recuperação das espécies. Entre as medidas, sugerem a proibição de pesca ou a limitação das quotas de pescado com base em dados rigorosamente científicos.
Quebra de 90%
Andrea Marshall, que lidera as pesquisas da Fundação Megafauna Marinha (MMF), contribuiu para o Projeto com dados recolhidos sobre avistamentos de mantas e de raias gigantes do diabo no sul de Moçambique, ao longo de 20 anos.

Nessas duas décadas, o decréscimo de avistamentos foi crescente e entre 2003 e 2016 superou os 90 por cento. Marshall, que tem dedicado a sua vida ao estudo destas espécies no sul de Moçambique, onde se encontravam as maiores populações em todo o continente, afirma que estas têm sido dizimadas na última década e meia devido à pressão da pesca, tanto direta como indireta.

"Enquanto bióloga, assistir ao declínio das raias mobula (mantas e raias gigantes do diabo) em Moçambique tem sido um pesadelo. Nunca poderíamos imaginar que fosse tão rápido e é a prova de que temos de tomar medidas imediatas para por fim às ameaças a estes animais, especialmente contra os seus habitats mais críticos", refere a investigadora.

"Os tubarões oceânicos e as raias sofrem quase todos gravemente de ameaças antropogénicas", afirma a bióloga, uma das principais cientistas do MMF. "O seu habitat pelágico preferido é escondido e esquecido. A pressão piscatória insustentável ou desregulada é difícil de controlar em águas internacionais, pelo que não surpreende que as suas populações estejam a cair a pique globalmente".

"Para reverter estas tendências precisamos perceber como poderemos criar regras estritas e aplicáveis em todos os oceanos. Literalmente, já não há tempo. Temos de agir já, se quisermos salvar as populações remanescentes", adverte a especialista.

O ecoturismo pode dar uma ajuda, já que também esta atividade está ameaçada. Em 2011, a indústria atraiu mais de 500 mil curiosos em 29 países diferentes. Estima-se que sustente atualmente pelo menos 10 mil postos de trabalho de forma direta e que apoie economias locais com milhões de dólares anuais. O desaparecimento dos tubarões oceânicos e das raias poderá igualmente ditar o seu fim.
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