Inquérito à Caixa. Relatório critica atuação do Banco de Portugal

por Carlos Santos Neves - RTP
À Caixa Geral de Depósitos é recomendado um apuramento de “responsabilidades dos processos ruinosos” Rafael Marchante - Reuters

A Caixa Geral de Depósitos não teve uma gestão prudente e o Banco de Portugal acabou por pôr em causa a utilidade da supervisão. É o que conclui o relatório preliminar da comissão de inquérito parlamentar ao banco do Estado, conhecido esta segunda-feira.

Entre as 366 páginas do relatório preliminar da comissão de inquérito, estima-se que “a CGD não foi gerida de forma sã e prudente, na concessão de vários dos créditos analisados”.

Já a supervisão bancária, a cargo do Banco de Portugal, foi exercida “de forma burocrática, não procurando olhar para além dos rácios de solvabilidade e níveis adequados de liquidez, de cada banco, e não percebendo o risco sistémico de algumas operações”.O relator é o deputado do CDS-PP João Almeida. O Projeto de Relatório Final, que inclui 27 conclusões, pode ainda ser alterado.


“A supervisão seguiu acriticamente as notas técnicas dos serviços do BdP, não exigindo mais informação do que aquela fornecida, demonstrando mais receio no confronto jurídico com os supervisionados do que com a possibilidade de erros ou fraudes”, acentua o Projeto de Relatório Final à II comissão Parlamentar de Inquérito à Recapitalização e Gestão da Caixa.

A instituição liderada por Carlos Costa, estima ainda o documento, “não seguia os problemas detetados, assumindo que as suas orientações eram executadas, o que muitas vezes não acontecia”.

Por outro lado, mostrou “uma confiança extrema nas linhas internas de defesa das instituições”, nomeadamente a direção de risco, a auditoria e a administração, bem como nas “externas”, ou seja, revisores e auditores.

“Nem perante reparos, ênfases ou denúncias públicas atuou com celeridade, colocando assim em causa a utilidade da sua supervisão”.

Ainda de acordo com o texto do deputado democrata-cristão João Almeida, o Banco de Portugal não se preocupou com a operacionalidade do modelo de governação da banca.

Marina Conceição - RTP

No mesmo relatório preliminar, considera-se que o supervisor procedia a um registo de administrador em modo “pró-forma”, faltando uma avaliação do “comportamento dos administradores”, da “concretização da segregação de poderes” e até da “falta de discussão dentro dos conselhos”.
Ser acionista “de forma presente”

O relatório recomenda também que o Governo, na qualidade de representante do Estado na Caixa, desempenhe “de forma presente” o papel de acionista. Isto porque “não pode bastar nomear a administração e aferir resultados quantitativos”.O relatório da II Comissão Parlamentar de Inquérito à Recapitalização da Caixa Geral de Depósitos e Gestão do Banco vai ser entregue à Procuradoria-Geral da República, segundo João Almeida.

Quanto ao Banco de Portugal, recomenda-se que realize “uma reflexão transparente sobre a atuação da supervisão portuguesa na crise financeira” e assuma “os erros e as lições aprendidas”, além de “promover uma maior transparência da sua atuação resultados e consequências”.

João Almeida defende, adiante, que a supervisão passe a recair “sobre a cultura, o comportamento e as dinâmicas internas que afetam o desempenho das instituições financeiras”, considerando “fatores essenciais para a responsabilização ética a reputação dos bancos e a confiança no sistema financeiro”.

“A reforma da supervisão deve ser uma prioridade”, reforça.

À própria Caixa Geral de Depósitos é recomendado um apuramento de “responsabilidades dos processos ruinosos”, com recurso a “todos os meios legais para se ressarcir das perdas”.

“A CGD deve verificar, tendo em conta as evidências e conclusões desta comissão, que todas as medidas são tomadas para que não se repitam as situações que geraram tão avultados prejuízos”, propõe a derradeira recomendação do documento.

Os trabalhos da comissão de inquérito parlamentar à Caixa tiveram início em março deste ano. O ex-governador do Banco de Portugal Vítor Constâncio e o empresário Joe Berardo foram figuras em destaque no rol de personalidades ouvidas pelos deputados.

c/ Lusa
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