Eusébio: da Mafalala ao topo do mundo

por Inês Geraldo - RTP
Eusébio da Silva Ferreira, figura maior do Sport Lisboa e Benfica Rob Mieremet (Nationaal Archief NL)

Eusébio da Silva Ferreira nasceu a 25 de janeiro de 1942 em Lourenço Marques, atual Maputo, capital de Moçambique. O antigo internacional português cresceu no Bairro da Mafalala, demonstrando desde cedo um grande amor pelo futebol.

Começou por jogar no bairro da Mafalala, um dos locais mais pobres de Maputo, juntando-se a um grupo denominado “Os Brasileiros”, onde era apelidado de "Pelé". A primeira tentativa de abordagem ao futebol profissional aconteceu com o Desportivo de Lourenço Marques, filial benfiquista em Moçambique. No entanto, Eusébio não passou pelo período de experiências.

Foi, então, no Sporting de Lourenço Marques que o antigo internacional português despontou para o mundo do futebol. Na filial sportinguista, Eusébio jogou por 42 vezes e conseguiu marcar uns incríveis 77 golos.



Estes números do "Pantera Negra" chamaram a atenção do Sporting CP que tentou contratar de imediato o jogador. No entanto, o Benfica também mostrou interesse e dá-se uma das mais polémicas transferências no futebol português.
A luta entre Sporting e Benfica
Fazendo parte da filial do Sporting em Moçambique, Eusébio teve o interesse dos leões de Lisboa “à perna”. O clube de Alvalade foi o primeiro a negociar o passe de Eusébio com o Sporting de Lourenço Marques mas o Benfica, que também demonstrou interesse, tentou igualmente a sua contratação.O negócio foi feito de maneira diferente pelos encarnados: enquanto o Sporting CP negociou com a sua filial em Moçambique, o Benfica foi diretamente à mãe de Eusébio, que aceitou a proposta do Benfica. Os leões voltaram a replicar com uma oferta de 500 contos, mas o jovem mantém-se fiel à palavra dada pela mãe.

Com uma intensa luta a acontecer entre os grandes rivais de Lisboa por Eusébio, o Benfica fez voar o jogador para Lisboa com um nome de uma cidadã portuguesa (Ruth Malosso), tendo um responsável do clube encarnado desviado o jovem para uma unidade hoteleira do Algarve.

O jogador permaneceu no sul de Portugal até que a Federação Portuguesa de Futebol deu razão ao Benfica no processo de contratação.

Com o tempo perdido devido à polémica contratação, Eusébio perdeu a primeira final europeia dos encarnados vencida frente ao Barcelona.
A carreira de sucesso no Benfica
O primeiro jogo de Eusébio de águia ao peito foi frente ao Atlético CP, numa partida de reservas. Logo aí se estreou a marcar, tendo encontrado o fundo das redes por três vezes.

Na época seguinte (1961/62), o “Pantera Negra” despontou para o futebol mundial. Apesar do terceiro lugar na Primeira Liga portuguesa (Campeonato Nacional da I Divisão na altura), Eusébio venceu a sua primeira Taça de Portugal e conquistou a única Taça dos Campeões Europeus do seu pecúlio.

Aconteceu frente ao Real Madrid, onde jogavam os poderosos Paco Gento, Ferenc Puskas e Alfredo Di Stéfano. O Benfica até começou mal a partida ao estar a perder por 2-0, aos 20 minutos de jogo, com dois tentos do astro argentino do Real Madrid.



No entanto, José Águas, Cavém e Coluna deram o empate ao Benfica, tendo Eusébio brilhado depois, na segunda parte. Com três golos para cada lado no placar, o King marcou por duas vezes (65' e 68') e deu uma vitória histórica ao clube da Luz, que em dois anos consecutivos venceu duas Taças dos Campeões Europeus.
Até à morte dos dois astros dos anos 60 (morreram em 2014, Eusébio em janeiro e Di Stéfano em julho), ambos partilharam admiração entre si. Se para Eusébio, Di Stéfano era o seu grande ídolo, o argentino sempre declarou que o português havia sido o melhor atleta que tinha visto jogar.
Depois de a partida ter sido terminada, Eusébio revelou que para ele a conquista da Taça Europeia pouco importava. O astro português revelou que o que mais queria era a camisola do seu grande ídolo, Alfredo Di Stéfano, lenda do Real Madrid. Depois de a conseguir, a estrela do Benfica fugiu com a recordação.

Eusébio permaneceu no Benfica até 1975. Muitos foram os colossos europeus que tentaram tirar o jogador aos encarnados. No entanto, Salazar não deixou o jovem craque sair do país, convocando-o para um serviço militar obrigatório.



Nas 15 épocas que vestiu de águia ao peito, Eusébio marcou mais de seis centenas de golos, sendo uma verdadeira lenda para os seus adeptos. No seu pecúlio, o jogador português logrou vencer 11 Campeonatos Nacionais, tendo sido, por sete vezes, o melhor marcador da maior competição futebolística em Portugal. A estes títulos, ainda juntou cinco Taças de Portugal.
História na seleção portuguesa
Eusébio nasceu em Maputo. No Estado Novo, porém, nas colónias portuguesas os seus cidadãos eram considerados portugueses. Por isso, depois de chegar a Portugal para representar o Benfica, o “Pantera Negra” ficou habilitado a representar a seleção das quinas.

A estreia aconteceu a 8 de Outubro de 1961, poucos meses depois de vencer a Taça dos Campeões Europeus pelo Benfica. O jogo foi disputado frente ao Luxemburgo, numa derrota por 4-2. Eusébio apontou um golo. O primeiro pela seleção das Quinas.

Desde essa altura, que o Pantera Negra passou 12 anos na seleção portuguesa. Jogou por 64 vezes com as quinas ao peito e marcou 41 golos, tendo ficado como o melhor marcador de Portugal durante largos anos, antes de ver o seu pecúlio batido por Pedro Pauleta e, mais recentemente, por Cristiano Ronaldo.
O Mundial de 1966
Foi num dos maiores palcos do futebol mundial, em Inglaterra, que Eusébio se deu a mostrar ao mundo com grandes exibições no Campeonato do Mundo de 1966.

A seleção portuguesa calhou no grupo 3, um conjunto de equipas complicado onde foram incluídos Hungria, Brasil e Bulgária.

Com uma esquadra de luxo e com grandes nomes como Hilário, Jaime Graça, José Augusto, Torres, Mário Coluna e António Simões, a seleção portuguesa entrou no mundial organizado pela Inglaterra a vencer a Hungria por 3-1.



Seguiram-se mais dois triunfos, frente Bulgária e uma surpreendente vitória sobre a poderosa seleção do Brasil de Pelé, Manga e Garrincha (começou a partida no banco).

Eusébio marcou dois dos três golos da seleção portuguesa que passou aos quartos-de-final da competição. Calhou à equipa das quinas jogar frente à Coreia de Norte e nessa partida deu-se uma das mais fantásticas reviravoltas da história do futebol.

A perder por 3-0 aos 25 minutos de jogo, o “Pantera Negra” marcou por quatro vezes para Portugal e deu a volta ao marcador de forma estoica, tendo José Augusto marcado o tento final para os portugueses e colocado o resultado final em 5-3.Eusébio conseguiu um póquer e espantava o mundo do futebol com grandes exibições pelos "Magriços".

Nas meias-finais, a Inglaterra, anfitriã do Mundial, jogou contra Portugal e apesar de mais um golo de Eusébio, a seleção portuguesa não foi capaz de chegar à final do Mundial. No fim da partida, imagens de Eusébio a chorar a derrota correram mundo.



Na última partida, de atribuição do terceiro e quarto lugares, Portugal derrotou a União Soviética, do mítico Lev Yashin, e averbou o melhor resultado de sempre de Portugal num Mundial, até hoje, acabando no último lugar do pódio, um respeitoso terceiro lugar.

Eusébio foi o melhor marcador da prova com nove golos marcados.
O pós-Benfica
Eusébio foi proibido de sair do Benfica durante os anos de Estado Novo, apesar de muitas propostas estrangeiras.

Apenas em 1975 o jogador português saiu da equipa da Luz, após 15 épocas a vestir de águia ao peito.

No entanto, o período pós-Benfica mostrou ser o menos fértil para Eusébio, que assolado por lesões, passou por vários clubes nos EUA, Canadá e México. Marcou poucos golos mas ainda viria a vencer dois títulos.

Tendo passado por mais sete clubes até acabar a carreira, o jogador português só conseguiu marcar mais 34 golos.Nos Estados Unidos, no primeiro clube que representou depois do Benfica, os Boston Minutemen, o "Pantera Negra" jogou por oito vezes e marcou dois golos, sagrando-se campeão. O mesmo viria a acontecer no México. Pelo FC Monterrey, Eusébio marcou apenas um golo mas conseguiu averbar o título de campeão nacional do país.

Depois de sair dos "encarnados", Eusébio continuou a ser um grande ícone do futebol mundial mas não conseguiu chegar às marcas goleadoras que o catapultaram para a fama, tanto no Benfica como por Portugal.

O clube onde foi mais prolífero foi o Toronto Metros, do Canadá. O "Pantera Negra" jogou por 25 vezes, tendo marcado 18 golos.



O King regressou a Portugal em 1978 e acabou a sua carreira, no União de Tomar, tendo jogado também pelo Beira-Mar.

Apesar de querer continuar a jogar, Eusébio foi massacrado por várias lesões. No Benfica, o internacional português jogou demasiadas vezes, tendo sido, frequentemente, assolado por faltas duras dos adversários. Disputou também partidas em esforço, com recurso a infiltrações.

Depois de acabar a carreira, Eusébio viria a ser operado por sete vezes aos joelhos (seis vezes ao direito e uma ao joelho esquerdo).
Prémios e honras na carreira do "Pantera Negra"


Na carreira de Eusébio há que destacar os vários prémios ganhos ao longo da carreira, com grande destaque para a primeira Bola de Ouro para um jogador português: em 1965, o "King" vencia o prémio da France Football, à frente do italiano Giacinto Facchetti e o espanhol Luis Suárez Miramontes.No ano seguinte, após a disputa do Mundial de 1966, Eusébio esteve muito perto da segunda Bola de Ouro. Por um ponto, Bobby Charlton (81), lenda inglesa, bateu o "Pantera Negra" (80).

Além da Bola de Ouro, o “Pantera Negra” venceu também duas Botas de Ouro: uma 1968 e outra em 1973, após se ter sagrado o melhor marcador dos campeonatos europeus.

Nos anos que se seguiram, depois de pendurar as chuteiras, os seus tempos foram passados no Benfica, tanto como adjunto da equipa principal como treinador das camadas jovens, sendo até hoje a figura mais proeminente da história dos encarnados.
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