Irão. Encontradas partículas com urânio enriquecido perto do valor necessário à produção de armas nucleares

por Andreia Martins - RTP
Dado Ruvic - Reuters

A Agência Internacional de Energia Atómica (AIEA) confirmou na terça-feira que os seus inspetores encontraram partículas de urânio altamente enriquecido, até 83,7 por cento, na central de Fordow, no Irão. Este é um valor muito próximo dos 90 por cento necessários para a produção de armas nucleares.

Os dados constam num relatório confidencial da Agência Internacional de Energia Atómica a que várias agências internacionais e meios de comunicação social tiveram acesso, nomeadamente a Reuters, agência France Presse e CNN.

A agência da ONU detetou partículas de urânio enriquecido a 83,7 por cento, muito perto dos 90 por cento necessários à produção de uma bomba nuclear. O acordo final, firmado em 2015, estabelecia ainda um limite de 300 quilogramas ao stock de material físsil pouco enriquecido (low-enriched uranium – LEU) em 3.67 por cento para os 15 anos seguintes.

As partículas de urânio altamente enriquecido (high-enriched uranium – HEU) foram encontradas nas instalações nucleares de Fordow, perto da cidade de Qom.

De acordo com os dados da Agência Internacional de Energia Atómica, o Irão tinha em junho de 2022 um stock de 7.537 quilogramas de urânio com baixos níveis de enriquecimento. Desde esse último relatório trimestral, o Irão passou de 25.2 quilogramas para 87.5 quilogramas no stock de urânio enriquecido a 60 por cento.

Estes números contrastam com os que eram apresentados há apenas alguns anos: mediante o acordo sobre o programa nuclear, o Irão tinha parado de enriquecer urânio acima de 5 por cento e reduziu o stock de urânio enriquecido com 20 por cento de material físsil.
Diretor-geral da AIEA viaja até ao Irão
Já esta quarta-feira, a agência iraniana Fars adiantou que o diretor-geral da AIEA, Rafael Grossi, irá viajar até ao Irão na próxima sexta-feira. Nesta deslocação, o responsável deverá reunir-se com o presidente iraniano, Ebrahim Raisi, no próximo sábado.

De acordo com um diplomata europeu citado pela agência France Presse, a reunião entre os dois responsáveis decorrerá durante a manhã e deverá servir como oportunidade para “relançar a relação ao mais alto nível”.

O responsável da agência sediada em Viena tinha alertado no início do ano que o Irão já está na posse de urânio altamente enriquecido suficiente para ter “várias” armas nucleares se assim quiser. Por outro lado, os Estados Unidos mantêm a crença de que Teerão não está à procura de desenvolver armas nucleares.

“Pelo que sabemos, não acreditamos que o Líder Supremo do Irão tenha tomado a decisão de retomar o programa de armamento que julgamos ter suspendido ou interrompido no final de 2003”, indicou recentemente o diretor da CIA, William Burns, em declarações à CBS.

No entanto, Colin Kahl, subsecretário norte-americano de Defesa na Administração Biden que esteve envolvido nas negociações do acordo de 2015, destaca em declarações à CNN que a evolução das capacidades nucleares do Irão desde 2018, ano em que Donald Trump retirou os Estados Unidos do acordo.

Se na altura o Irão poderia demorar “cerca de 12 meses” para obter o material físsil suficiente para uma bomba nuclear, neste momento “demoraria cerca de 12 dias”, alertou o responsável.

Neste contexto, o governo de Israel - um dos principais inimigos regionais e considerado o único detentor de armas nucleares no Médio Oriente - tem lançado várias ameaças de ações militares contra Teerão. De visita à Alemanha na terça-feira, o ministro israelita dos Negócios Estrangeiros, Eli Cohen, sublinhou que há duas formas de lidar com a República Islâmica: a denúncia junto do Conselho de Segurança das Nações Unidas, com a restituição das sanções internacionais, e mantendo “uma opção militar credível em cima da mesa”.

As negociações para salvar o acordo de 2015, conhecido formalmente como Joint Comprehensive Plan of Action (JCPOA), estão congeladas desde o verão de 2022. O entendimento, que previa o levantamento de sanções em troca do controlo e vigilância das atividades nucleares de Teerão, deteriorou-se após a retirada unilateral por parte dos Estados Unidos em maio de 2018.

Na altura, os restantes signatários, incluindo a União Europeia, Rússia e China, persistiram no entendimento com o Irão, mas o país foi deixando de cumprir com os parâmetros e compromissos assumidos, argumentando que muitas das sanções internacionais levantadas por ocasião do acordo tinham sido repostas na prática com a saída dos norte-americanos.

Mais recentemente, a situação política interna no Irão, com os protestos que se intensificaram nos últimos meses, e o contexto internacional, sobretudo desde o início da invasão russa da Ucrânia, têm dificultado o diálogo entre as partes envolvidas.
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