Macron "deve curvar-se". Esquerda aliada bate extrema-direita aquém da maioria absoluta

por Carlos Santos Neves - RTP
Festejos em Marselha, no sul de França, face à vitória da Nova Frente Popular nas legislativas Teresa Suarez - EPA

À segunda volta, os eleitores franceses confirmaram o prognóstico, nas derradeiras sondagens, de ausência de maioria absoluta. Mas não o de uma vitória do Rassemblement National, a formação de extrema-direita de Marine Le Pen e Jordan Bardella. Ao início da noite de domingo, perante as projeções que o remetiam para um terceiro lugar, este último queixava-se de “alianças desonrosas”. Já Jean-Luc Mélenchon, rosto da Nova Frente Popular, vencedora das legislativas, apontou ao Eliseu: Macron tem agora “o dever” de chamar esta coligação “a governar”.

Contenção de danos. Foi esta a palavra de ordem no quartel-general do Rassemblement National, logo que as projeções de resultados relegaram o partido da extrema-direita para um inesperado terceiro lugar, uma semana depois de uma primeira volta que parecia prometer um triunfo.

O presidente do partido, Jordan Bardella, começou por agradecer aos eleitores pelo que descreveu como uma “onda patriótica”. Apressou-se, todavia, a apontar o dedo a “alianças desonrosas” à esquerda.
”Infelizmente, alianças desonrosas estão esta noite a privar a política francesa de uma recuperação. Esta noite, os acordos eleitorais estão a atirar a França para os braços da extrema-esquerda de Jean Luc Mélenchon”, reagiu o candidato da direita radical.

“Apesar de uma campanha de segunda volta marcada por alianças contranatura, que procuraram de todas as maneiras impedir os franceses de escolher livremente uma política diferente, o Rassemblement National realizou hoje o avanço mais importante de toda a sua história”, quis ainda propugnar Jordan Bardella no pavilhão de Chesnaye du Roi, no sudeste de Paris.

“Tendo em conta a política que vai ser aplicada nos próximos meses e que não vai responder a nenhuma das preocupações dos franceses, o Rassemblement National incarna a única alternância perante o partido único”, estimaria.

Depois foi a vez de Marine Le Pen. A figura de proa do Rassemblement abeirou-se dos jornalistas, arrebatando um microfone da TF1, para exclamar: “A nossa vitória fica apenas adiada”.

Le Pen tratou de agitar a ideia de que o seu é “o primeiro” partido em França: “A maré está a subir. Ela não subiu assim tão alto desta vez, mas ela continua a subir e, consequentemente, a nossa vitória é apenas adiada. Tenho demasiada experiência para ficar desiludida por um resultado em que duplicamos o nosso número de deputados”.
Emmanuel Macron, “deve curvar-se”
Já com um mar de apoiantes da Nova Frente Popular a afluir à Praça da República, no coração de Paris, antes mesmo de o Rassemblement National reagir, Jean-Luc Mélenchon, líder do partido de extrema-esquerda França Insubmissa, contraforte do bloco da Nova Frente Popular, orientava baterias para o Palácio do Eliseu.

Emmanuel Macron, lançava Mélenchon, “deve curvar-se e admitir a sua derrota sem tentar contorná-la” e encarregar a Nova Frente Popular de formar governo.
“A derrota do presidente está claramente confirmada”, clamou. “O presidente tem o dever de chamar a Nova Frente Popular a governar", reiterou, para acrescentar que também o primeiro-ministro deveria “sair”.
…e Attal abriu a porta de saída

Numa intervenção ao país, Gabriel Attal anunciou que tenciona apresentar já esta segunda-feira a sua demissão do cargo de primeiro-ministro ao presidente da República. Tratou de garantir, ainda assim, estar preparado para assegurar a gestão corrente enquanto não for nomeado um novo chefe de governo.
“Esta dissolução não a escolhi”, atalhou o governante francês.
“Esta noite, nenhuma maioria absoluta pôde ser obtida pelos extremos”, assinalou Attal, para frisar, adiante, que “ser primeiro-ministro” foi “a honra” da sua vida.

“Assim, fiel à tradição republicana, entregarei amanhã a minha demissão ao presidente da República. Assumirei, evidentemente, as minhas funções enquanto o dever o exigir”.

“Esta noite começa uma nova era”, rematou, acrescentando que o destino de França se decide “como nunca no Parlamento”.
Os números
Os relógios em França marcavam as 20h00 (19h00 em Lisboa) quando os meios de comunicação social do país começaram a divulgar as projeções de resultados: a Nova Frente Popular ficava à cabeça da segunda volta com a eleição de 172 a 192 deputados à Assembleia Nacional – sem alcançar uma maioria absoluta, cujo limiar é de 289 assentos no hemiciclo.

Num volte-face relativamente à primeira volta, o Rassemblement National, de extrema-direita, surgia em terceiro lugar com 132 a 152 deputados eleitos.Quando estavam definidos 552 dos 577 assentos no Parlamento francês, a Nova Frente Popular garantia a eleição de 176 deputados, o campo presidencial Ensemble elegia 154 e o Rassemblement National 140.


Em detalhe, à esquerda, as projeções atribuíam entre 68 a 74 assentos à França Insubmissa, entre 63 e 69 ao PSF e entre 32 e 36 aos Ecologistas.

No campo presidencial, a Renascença deveria obter entre 95 a 105 assentos, o MoDem 31 a 37 e o Horizons entre 24 a 28.

E no que toca ao domínio do Rassemblement National, os números apontavam para a eleição de 120 a 136 deputados deste partido e de 12 a 16 deputados por parte da fação aliada dos Republicanos.

Os Republicanos obteriam entre 57 a 67 assentos.

De acordo com o resultados finais, a Nova Frente Popular obteve 182 lugares no parlamento de 577 lugares, a aliança de centro do presidente Macron obteve 158 lugares e o Rassemblement National e os seus aliados, obtiveram apenas 143 lugares. Já os Republicanos e outros partidos de direita confirmaram os 67 lugares.
“Prudência”
Pouco depois da divulgação das projeções, em comunicado, o Palácio do Eliseu vinha deixar claro que o presidente iria aguardar a “estruturação” do Parlamento, no seguimento do escrutínio, antes de “tomar as decisões necessárias”. O que, na prática, poderá empurrar uma clarificação para o próximo dia 18 de julho.

Indicava ainda o Eliseu que Emmanuel Macron optaria por uma postura de “prudência” face à distribuição de forças emanada do processo eleitoral.
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