Tínhamos muito para celebrar, mas não podíamos por medo

por Lusa

 O investigador Nuno Rodriguez Tchailoro não fugiu depois de votar no referendo de 30 de agosto de 1999, que deu a independência a Timor-Leste, permaneceu em Díli porque tinha a responsabilidade de continuar a denunciar a violação dos direitos humanos.

Há 25 anos, Nuno Rodriguez Tchailoro, investigador independente na área de história da ocupação indonésia e antigo assessor do ex-Presidente Lu Olo, pertencia à Associação HAK de direitos humanos, que acompanhou a votação no referendo.

"Nós estávamos com outros colegas da Associação HAK e decidimos não fugir para o mato, porque tínhamos a responsabilidade como organização dos direitos humanos de ficar para continuar a disseminar a informação sobre a violação dos direitos humanos", disse à Lusa.

Em 30 de agosto de 1999, 344.580 das 446.666 pessoas registadas (433.576 em Timor-Leste e 13.090 nos centros no estrangeiro) escolheram a independência do país e consequentemente o fim da ocupação da Indonésia (a Indonésia invadiu Timor-Leste em 07 de dezembro de 1975), apesar da violência perpetrada pelas milícias que apoiavam a integração, apoiadas pelas forças militares indonésias.

Com o anúncio dos resultados em 04 de setembro no Hotel Mahkota, hoje conhecido como Hotel Timor, começou uma onda de violência em Díli com assassínios, deslocação forçada de pessoas para Timor Ocidental, ataques à igreja católica e outras organizações, obrigando milhares de timorenses a fugirem.

Nuno Rodriguez Tchailoro e os colegas ouviram o anúncio oficial dos resultados no escritório da HAK, mas já sabiam que a independência venceria.

"Durante o anúncio pelo Kofi Annan [antigo secretário-geral da ONU] tínhamos uma televisão pequena e quando fez o anúncio, queríamos celebrar, gritar bem alto, mas não conseguimos, porque ao nosso lado, os nossos vizinhos eram o centro de inteligência da Indonésia", disse.

Do momento, lembrou à Lusa os abraços e o choro, mas a impossibilidade de celebração.

"Uma emoção ambivalente, muito para celebrar, mas não podíamos celebrar, e tínhamos medo", afirmou o antigo ativista, salientando que sabiam que as milícias se preparavam para os atacar no dia a seguir à noite. 

A "sorte", segundo Nuno Rodriguez Tchailoro, é que com eles, além de estarem colegas indonésios, estavam também um cidadão norte-americano e vários britânicos.

"Telefonamos para a UNPOL [Polícia das Nações Unidas] a dizer que havia cidadãos estrangeiros para salvar e por causa deles também fomos retirados", debaixo de fogo e de pedras, explicou.

A polícia da ONU chegou com as milícias à porta, que não conseguiram entrar nas instalações da HAK, porque, como já previam o ataque, eletrificaram os portões e, portanto, sempre que lhes tocavam apanhavam um choque elétrico.

Nuno Rodriguez Tchailoro acabou por ser retirado do país em 06 de setembro, mas regressou a Timor-Leste, a Baucau, nos primeiros voos apoiados pela ONU.

O regresso ao país foi um "choque", mas o ativista salientou que já sabiam que a "Indonésia ia destruir toda a cidade".

O antigo ativista foi trabalhar para Lospalos, a cerca de 250 quilómetros a este de Díli, para contar quantas pessoas tinham sido assassinadas e fazer relatórios de direitos humanos.

"Não foi fácil, mas a expressão que usávamos naquele tempo era: somos livres. Apesar das dificuldades, a nossa liberdade era mais importante", disse.

Passados 25 anos, Nuno Rodriguez Tchailoro afirmou que inicialmente, como nova Nação, a ideia era "fazer melhor" que outros países, porque podiam aprender com os fracassos, vantagens e desvantagens com os outros.

"Mas depois de 25 anos não aprendemos lições. O que aconteceu é que repetimos os mesmos erros que outros cometeram por causa da inexperiência", disse.

Nuno Rodriguez Tchailoro referiu que a educação tem uma qualidade muito má, sendo a "base para desenvolver" o país, sendo que na saúde o sistema também "não é muito bom".

"Sonhámos naquele tempo ter educação e saúde com boa qualidade, mas a realidade é muito diferente", disse.

"Então em termos de recursos humanos se continuarmos assim como é que esta Nação vai desenvolver-se melhor no futuro", questionou, salientando que o que se passa é diferente daquilo que foi sonhado na altura da resistência.

 

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