Superliga. Reações contrárias do desporto à política

por Marcos Celso - RTP
Reuters

A ideia está a mexer com o futebol europeu. As reações desportivas e políticas são quase todas contrárias à nova competição de elite anunciada por 12 dos principais clubes de Espanha, Inglaterra e Itália. Tal como previsto, a UEFA veio anunciar um novo formato da Liga dos Campeões.

AC Milan, Arsenal, Atlético de Madrid, Chelsea, FC Barcelona, Inter Milão, Juventus, Liverpool, Manchester City, Manchester United, Real Madrid e Tottenham “uniram-se na qualidade de clubes fundadores” da Superliga e projetam para bereve o início da competição.

Os promotores da Superliga adiantam que a prova será disputada por 20 clubes, pois, aos 15 fundadores – apesar de terem sido anunciados apenas 12 -, juntar-se-ão mais cinco clubes, qualificados anualmente, com base no desempenho da época anterior.

A época arrancará em agosto, com dois grupos de dez equipas e os jogos, em casa e fora, serão realizados a meio da semana, mas todos os clubes participantes continuarão a disputar as respetivas ligas nacionais.

O comunicado dos 12 clubes surgiu no mesmo dia em que a UEFA reafirmou que excluirá os clubes que integrem uma eventual Superliga europeia de futebol, e que tomará “todas as medidas necessárias, a nível judicial e desportivo” para inviabilizar a criação de um “projeto cínico”.

Na luta contra a pretensão de alguns dos mais poderosos clubes da Europa, a UEFA disse contar com o apoio das federações de Inglaterra, Espanha e Itália, bem como das ligas de futebol destes três países.

Em janeiro, a FIFA já tinha avisado, num comunicado conjunto com as confederações do futebol mundial, que impediria de participar nas suas competições qualquer clube ou jogador que integrasse uma eventual competição de elite, disputada por convite por alguns dos maiores clubes europeus.

Presidente da UEFA diz que Superliga é “contra tudo o que o futebol deve ser”

Aleksander Ceferin vê na ideia de criar uma Superliga uma iniciativa movida pela “ganância”, considerando que são planos que vão “contra tudo aquilo que o futebol deve ser”.

“A UEFA e o futebol estão unidos contra a proposta que vimos de alguns clubes na Europa que são movidos pela ganância. Toda a sociedade e os governos estão unidos contra estes planos cínicos, que são contra o que o futebol deve ser. A integralidade e o mérito desportivo são essenciais e não vamos deixar que isso mude nunca”, disse Ceferin em conferência de imprensa, tendo anunciado um novo modelo nas competições europeias a partir de 2024.


Benfica, Sporting e Sp.Braga contra Superliga 
A posição "encarnada" não é de agora. A criação de uma Superliga europeia de futebol, anunciada no sábado por 12 dos principais clubes de Espanha, Inglaterra e Itália, tem o "voto contra" do clube da Luz, segundo confirmou hoje à Lusa fonte oficial dos ‘encarnados’.

A mesma fonte recordou a posição defendida pelo clube, em novembro de 2020, pelo administrador da SAD Domingos Soares de Oliveira, em entrevista ao portal 'Off the Pitch', reconhecendo que um convite para a integração seria difícil de recusar.

"A minha opinião é contrária, mesmo que o Benfica fosse um dos clubes representados na SuperLiga europeia. Se acontecer [o convite] quase nem é preciso pensar, mas preferia que não acontecesse", disse, na altura, Domingos Soares de Oliveira.

Do outro lado da Segunda Circular lisboeta, O presidente do Sporting, Frederico Varandas, assume igual postura e manifestou-se hoje contra a Superliga europeia de futebol, por ser contrária aos princípios de mérito que devem existir na modalidade.

"Com a informação recolhida até ao momento, esta Superliga vai contra todos os princípios democráticos e de mérito que devem imperar no futebol", afirmou Frederico Varandas, em resposta à agência Lusa.

O Sporting de Braga manifestou-se "liminarmente contra a criação da Superliga Europeia", por entender que o futebol não pode ser dividido entre "clubes ricos e os restantes" e aponta uma contradição aos três 'grandes' portugueses.
FC Porto não deu "grande atenção" 
O presidente do FC Porto, Pinto da Costa, reagiu hoje à embrionária Superliga Europeia de futebol, afirmando que o clube não deu “grande atenção”, porque vai contra as normas da União Europeia e da UEFA.

“Primeiro, a União Europeia não permite que haja um circuito fechado de provas como há na NBA e, segundo, estando a nossa federação contra e fazendo parte da UEFA, ao abrigo desse quadro, não podemos participar em algo que é contra as regras da União Europeia e da UEFA”, disse.

Pinto da Costa, que admitiu terem existido alguns contactos informais de alguns clubes sobre a matéria, colocou ainda em dúvida que o projeto anunciado por 12 clubes vá para a frente.

“Estamos na ‘Champions’ [Liga dos Campeões] e esperamos continuar a estar por muitos anos”, adiantou o líder dos ‘dragões’, apontando o exemplo de alguns clubes de topo europeu, como o Bayern de Munique, Ajax e Paris Saint-Germain, que estão fora do projeto.
Bayern de Munique e Borussia Dortmund opõem-se 

O Bayern de Munique e o Borussia, dois clubes alemães de futebol da direção da Associação Europeia de Clubes (ECA) estão “totalmente contra” criação da Superliga europeia, disse hoje Hans-Joachim Watzke, presidente da equipa de Dortmund.

“Os dois clubes alemães representados na direção da ECA apresentaram opiniões 100% idênticas em todas as discussões”, referiu Hans Joachim Watzke, em comunicado, divulgado no site do clube.

Pouco antes, a Federação Alemã de Futebol (DFB) também se manifestou “frontalmente contra” a iniciativa “egoísta” de 12 clubes europeus, que não inclui qualquer clube germânico.

O presidente do Bayern de Munique, Karl-Heinz Rummenigge, referiu que a Superliga europeia de futebol "não vai resolver os problemas financeiros" decorrentes da pandemia de covid-19.

"Não acredito que a Superliga vai resolver os problemas financeiros dos clubes europeus originados pela pandemia do novo coronavírus. Os clubes devem, sim, trabalhar em conjunto para assegurar que os custos, sobretudo os salários de jogadores e comissões de agentes, estão de acordo com as receitas, de forma a tornar todo o futebol europeu mais equilibrado", transmitiu Rummenigge, em comunicado divulgado no site oficial do Bayern.

De resto, o antigo internacional alemão assegurou que os bávaros, vencedores da última edição da Liga dos Campeões, não integraram o grupo de emblemas que criaram a Superliga europeia.

"O Bayern não esteve envolvido na criação da Superliga. Estamos convencidos de que o atual formato do futebol europeu garante bases sustentadas. O Bayern congratula a alteração feita ao formato da Liga dos Campeões, porque acreditamos que é o passo certo para ajudar a desenvolver o futebol. A mudança na fase de grupos vai contribuir para o aumento do entusiasmo e da emoção na competição", disse.

Bruxelas quer respeito pelos valores do desporto no espaço comum

A Comissão Europeia considera importante que sejam respeitados os valores do desporto dentro do espaço comum e promete avaliar se esta nova estrutura pode levantar questões de concorrência dentro do negócio do futebol.
Comissário europeu considera Superliga contrária aos valores da UE
Margaritis Schinas, comissário com a pasta da Promoção do Modo de Vida Europeu, afirmou que a União Europeia deve defender “um modelo europeu de desporto baseado na diversidade e na inclusão”, opondo-se ao projeto de criação de uma Superliga europeia anunciada por 12 clubes.

A reação surgiu numa mensagem publicada na conta oficial da rede social Twitter de Margaritis Schinas.
Adeptos de futebol estão “completamente contra” a Superliga europeia
Os adeptos de futebol veem na Superliga europeia uma “competição fechada onde o mérito desportivo é completamente colocado de lado”, disse hoje à agência Lusa a presidente da Associação Portuguesa de Defesa do Adepto (APDA).

“Não queremos mais jogos de futebol, queremos melhores jogos, competitividade entre as equipas e proteção das Ligas nacionais, que é disso que vive verdadeiramente o desporto e não destas Ligas milionárias onde só entra quem tem cartão de acesso, ou seja, euros”, criticou Martha Gens.

A presidente da APDA lembrou, de resto, que já em janeiro a associação e os grupos organizados de adeptos de Sporting, FC Porto, Benfica, Sporting de Braga e Vitória de Guimarães se associaram a uma posição conjunta contra a Superliga europeia da Football Supporters Europe (FSE), que inclui grupos organizados de adeptos dos principais clubes europeus, entre os quais alguns dos fundadores da competição.

Adeptos de Chelsea, Liverpool, Manchester City, Manchester United e Tottenham (Inglaterra), Atlético de Madrid, Barcelona e Real Madrid (Espanha), mas também de clubes que, para já, não se encontram entre os 'fundadores' da Superliga, como Paris Saint-Germain (França) e Bayern de Munique (Alemanha), assinaram essa posição conjunta.

“Todos os adeptos do futebol europeu estão contra a criação deste que parece quase um clube de golfe, onde só entra quem tem convite e quem paga. Não interessa se jogamos bem ou mal, é uma espécie de partidas entre amigos. E isto tira todo o sentido que as competições europeias ainda têm”, reforçou Martha Gens.
FIFPro preocupada com impacto da Superliga nos direitos dos futebolistas

A Associação Internacional de Futebolistas Profissionais (FIFPro) manifestou hoje preocupação com o possível impacto da criação de Superliga europeia, e lamentou que os jogadores sejam ignorados nas negociações e ameaçados de exclusão das seleções dos seus países.

“A chegada do futebol europeu a este ponto de possível rutura é reflexo de uma governação na qual alguns tem usufruído de demasiados poderes, e grupos como os jogadores, e os adeptos têm sido ignorados”, refere a FIFPro, em comunicado.

A associação considera que as ameaças “de uma competição separada e as posteriores concessões para reformar as competições europeias condicionaram a tomada de decisões durante anos”, e entende que esta decisão de alguns clubes “substitui os debates transparentes e inclusivos sobre a reforma das competições”.

“Os jogadores continuam a ser usados como ativo e alavanca nas negociações. Isto é inaceitável para a FIFPro, para as 64 associações nacionais e mais de 60.000 jogadores que representamos”, refere o comunicado, acrescentando: “Opomo-nos totalmente a medidas, de qualquer das partes, que retirem direitos aos jogadores, como, por exemplo, a sua exclusão das seleções”.

Boris Johnson vai fazer "tudo o que puder" para impedir Superliga europeia
O primeiro-ministro britânico~afirmou hoje que vai fazer “tudo o que puder” para impedir a criação da Superliga europeia de futebol, anunciada domingo e que inclui seis equipas inglesas.

“Vamos analisar tudo o que podemos fazer com as autoridades do futebol para garantir que a Superliga não aconteça como está planeada. Isto não é uma boa noticia para os adeptos nem para o futebol deste país. Não gosto da aparência desta proposta e farei tudo o que puder para que não aconteça”, afirmou Boris Johnson aos jornalistas ingleses.

Além do primeiro-ministro, no Reino Unido várias vozes já se mostraram contra o projeto da Superliga, desde pessoas ligadas à política, como antigo jogadores e adeptos dos seis clubes ingleses envolvidos (Manchester United, Chelsea, Arsenal, Tottenham, Manchester City e Liverpool).
Primeiro-ministros de Itália e Hungria ao lado da UEFA e FIFA

Mario Draghi e Viktor Orbán, respetivamente, manifestaram hoje o seu incondicional apoio à UEFA na sua oposição à criação da Superliga Europeia.

“O governo está a acompanhar de perto o debate em torno do projeto da Superliga e apoia firmemente as posições das autoridades do futebol italiano e europeu no sentido de preservar os campeonatos nacionais, os valores da meritocracia e a função social do desporto”, disse Mario Draghi, num curto comunicado do governo italiano.

Esta dissidência motivou uma união rara na política transalpina, pois foi reprovada por todos os partidos, incluindo os mais extremistas.

O Primeiro-ministro da Hungria, Viktor Orbán, também está ao lado da UEFA e a FIFA, bem como a federação do seu país, na demanda de “proteger a integridade das competições federais, tanto a nível nacional como europeu”.

“A Hungria está convencida de que a beleza e a grandeza do maior jogo do mundo residem no fato de que pertence a todos, e os ricos não podem se apropriar dele”, vincou o governante.


c/ Lusa
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