"Quando se trata de calor e vulnerabilidade, o fator-chave é o nível de rendimento", apontam investigadores

por RTP
Espanha, 11 agosto de 2024. Bilbao atingiu temperatura recorde Vincent West - Reuters

O calor mata na Europa e a população com menores rendimentos é quem mais sofre. A relação entre os dois fatores tem sido debatido por vários especialistas, nomeadamente em Espanha, onde foi analisado como o calor extremo afetou 17 distritos em Madrid. O estudo realça que pessoas de grupos de rendimento abaixo da média têm mais probabilidade de morrer perante altas temperaturas que outras com maior capacidade económica.

“É senso comum”, sublinha Julio Díaz Jiménez, investigador do instituto de saúde Carlos III de Madrid e coautor da análise. Alerta porém que o clima quente potenciado pela poluição de carbono matou quase 50 mil pessoas em toda a Europa, em 2023.

“Precisamos de fazer soar o alarme de que isto é extremamente urgente”, acrescenta Yamina Saheb, autora principal do mais recente relatório do IPCC, Painel Intergovernamental dedicado à mitigação das Alterações Climáticas.

E insiste: “Precisamos decidir se esta é a última vez que teremos pessoas a morrer por causa do calor em países europeus”.

Díaz Jiménez ao analisar o impacto das altas temperaturas que atingiram 17 distritos da capital espanhola revela que as vagas de calor tiveram impacto na mortalidade em apenas três zonas — aquelas onde o rendimento familiar estava abaixo da média.

“Uma onda de calor não é a mesma quando se está num quarto partilhado com outras três pessoas e sem ar condicionado, comparativamente a quem está num condomínio com acesso a uma piscina e ar condicionado” argumenta Díaz Jiménez, citado na publicação The Guardian.

Alargando o espetro para todo o território espanhol “vimos a mesma coisa”, afirma. E deixa claro: “Quando se trata de calor e vulnerabilidade, o fator-chave é o nível do rendimento”.

No início deste ano, a organização Save the Children alertou que uma em cada três crianças na Espanha não conseguia se refrescar em casa. A instituição de defesa da criança afirmou que essa precariedade apresenta uma influência “extremamente prejudicial” na saúde mental e física de mais de dois milhões de crianças.

As pessoas pobres vivem a maioria das vezes em casas de menor qualidade, lotadas com familiares, e com falhas graves de ventilação.
O rendimento baixo deixa essa faixa da população mais propensa a sofrer de condições que podem ser exacerbadas pelo calor extremo.

Muitos desses trabalhadores tem atividades ligadas à agricultura e construção, onde estão normalmente expostos a altas temperaturas

A relação entre stresse derivado do calor e a pobreza também tem sido um assunto debatido na Universidade norte-americana de Maryland que documentou como bairros de baixo rendimento no país tinham maior probabilidade de serem mais quentes do que os seus equivalentes menos pobres.

Já a Europa é um continente que está a aquecer a um ritmo muito mais rápido do que outras partes do mundo. O ano de 2023 foi classificado como o mais quente até agora registado e 2024 vai no seu encalço. 

Perante tais dados, Saheb deixa claro:“O aquecimento global está a matar pessoas”.

E acentua: “A questão que se coloca é - quantas pessoas serão necessárias para que nossos decisores políticos, defensores e especialistas percebam que a pobreza energética no verão é um problema importante?”

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