Estudo revela. Maior "pedra azul" do centro de Stonehenge é proveniente da Escócia e não do País de Gales
Uma nova análise à composição química da maior "pedra azul" de Stonehenge e idade dos minerais nela contidos descobriu que essa combinação é "uma cópia exata da Bacia Orcadiana no nordeste da Escócia". Sendo assim, o megálito terá sido transportado até à planície de Salisbury a partir do canto nordeste da Escócia, a uma distância de pelo menos 750 quilómetros, dizem os investigadores.
A descoberta “impressionante” e "genuinamente chocante", assim descrevem os investigadores, está a contar uma nova história das comunidades neolíticas construtoras do monumento megalítico britânico de Stonehenge.
Os arqueólogos já tinham apontado que algumas das pedras de Stonehenge tinham sido transportadas, de alguma forma, do País de Gales.
Se os cerca de 200 quilómetros do percurso já causavam espanto, os 750 km, a partir do nordeste da Escócia, estão a levantar novas questões sobre a circulação desta matéria-prima.
Rob Ixer, investigador sénior honorário da University College London (UCL) e um dos especialistas coautor do estudo que foi publicado na revista Nature, explicava esta quarta-feira que a descoberta “reescreve completamente as relações entre as populações neolíticas de todas as Ilhas Britânicas”.
“O megálito, conhecido como pedra do altar, foi transportado por povos pré-históricos desde pelo menos a atual Inverness e, potencialmente, das ilhas Orkney. Este novo dado não altera apenas o que pensamos sobre Stonehenge, mas também o que pensamos sobre todo o Neolítico tardio", sublinha.
“A ciência é linda e notável, e [esta descoberta] será discutida por décadas. É de cair o queixo”, acentua Ixer.
O megálito escocês
A investigação consistiu em analisar a composição química e a idade dos minerais dentro de uma das pedras centrais do monumento e comparar com o que se conhece de combinações geológicas no Reino Unido.
O foco dos especialistas foi o enorme bloco de arenito, com cinco metros de comprimento e peso estimado em seis toneladas, que está semienterrado no centro do monumento, preso sob dois “sarsens” (blocos de arenito caídos) e que não é visível na perspetiva dos visitantes.
Este megálito central, também conhecido por pedra do altar, é proveniente de uma rocha sedimentar chamada arenito vermelho antigo, embora seja classificada como uma pedra azul não local ou exótica.
A pedra do altar está enterrada à face do terreno, sob duas pedras sarsen caídas | Aberystwyth University
Os arqueólogos acreditavam que teria viajado do País de Gales, tal como um outro conjunto de pedras azuis de Stonehenge cujo local de extração está apontado às colinas de Preseli, em Pembrokeshire.
Porém, os especialistas voltaram ao famoso monumento com novas perguntas para investigar a grande pedra azul do altar.
Nick Pearce, professor de geografia e ciências da terra em Aberystwyth e coautor da análise, argumenta que os dados combinados da composição química da pedra e a idade dos minerais nela contidos dão uma “impressão digital da idade” característica ao arenito.
“Com essa impressão digital da idade pode-se combiná-la com o mesmo tipo de rochas existentes do Reino Unido. E, neste caso, a correspondência para a impressão digital da idade foi uma cópia exata da Bacia Orcadiana no nordeste da Escócia”, destacou.
Especificamente, "apresentámos a idade e a química dos grãos de zircão detrítico, apatita e rutilo de dentro de fragmentos da Pedra do Altar [apontam para] uma região de fonte cristalina Laurentiana final que foi sobreimpressa pelo magmatismo Grampiano (cerca de 460 milhões de anos atrás)", diz a investigação.
"Os espectros de idade de zircão detrítico confirmam associações petrográficas entre a Pedra do Altar e a Bacia Orcadiana", conclui o estudo.
“O que foi completamente inesperado para nós”, admite Pearce.
Nick Pearce, que na imagem estuda um outro megálito de Stonehenge, afirma que o perfil da pedra do altar é um "sósia fiel" da Bacia Orcadiana, no nordeste da Escócia | Aberystwyth University
A construção em Stonehenge começou por volta do ano 3000 a.C. e sofreu modificações subsequentes durante os dois milénios seguintes. Os megálitos de Stonehenge são divididos em duas categorias principais: pedras sarsen e pedras azuis.
Puzzle da localização da extração
De acordo com o estudo, os especialistas estreitaram a área para tentar estabelecer o local potencial de origem da pedra do altar. Um desses sítios geológicos pode ser Orkney.
De acordo com o estudo, os especialistas estreitaram a área para tentar estabelecer o local potencial de origem da pedra do altar. Um desses sítios geológicos pode ser Orkney.
Um outro é um triângulo de terra perto do atual John o'Groats, em Caithness.
E um terceiro local possível é uma estreita faixa costeira que se estende ao sul, até Moray Firth, em torno de Inverness e a leste até ao atual Elgin. Todas elas terras a norte da Escócia.
Viagem por água ou por terra?
Para além do quebra-cabeças referentes às origens da extração das pedras surge sempre a mesma pergunta: como é que os construtores de Stonehenge transportaram a pedra gigante para Salisbury?
“Dadas as grandes barreiras terrestres na rota do nordeste da Escócia para Salisbury Plain, o transporte marítimo é uma opção viável”, sustenta o autor principal, Anthony Clarke, da Curtin University.
O debate mantém-se aceso entre especialistas externos ao estudo, como o arqueólogo e autor de “Como construir Stonehenge”, Mike Pitts. Este investigador aponta a via terrestre como mais provável, tendo a pedra sido arrastada.
“Se se colocar uma pedra num barco no mar, não só se corre o risco de perder a pedra – como também deixa de ser visível pelas comunidades”. Em vez disso, “uma jornada por terra, levando muitos anos, envolveria as pessoas no caminho, onde a pedra “se tornaria cada vez mais preciosa, à medida que viajava para o sul”, defende Pitts, citado no Guardian.
“Por mais impossível que pareça hoje, uma jornada por terra estava facilmente ao alcance da tecnologia neolítica”, acrescenta. De qualquer forma, este estudo revela-se “emocionante e muito significativo”, alega o arqueólogo.
“Há muito tempo se sabia que as pedras azuis tinham vindo do País de Gales, mas agora são identificadas ligações com uma parte bem diferente da Grã-Bretanha e significativamente mais distante de Stonehenge”, realça Pitts.
Estes novos dados “sugerem que o local era conhecido não apenas pelas pessoas do sul, mas por uma área muito mais ampla – e isso levanta mais possibilidades para pensamos sobre a Grã-Bretanha Neolítica”, remata.
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